Um chamado alto corta o ar quente da estação Maracanã : “Ô Jonathan! Jonathan! Vem cá cara!”. Os olhos cansados dos que esperam os trens – minutos mais longos que os de microondas – se desviam dos celulares. Jonathan usa bermuda rosa , blusa listrada e carrega um saco preto nas mãos. Caminha do outro lado da plataforma, como quem quer se dissolver no horizonte férreo. Quem brada seu nome veste camisa social, calça jeans, óculos escuros e carrega uma caixa de chocolates caros – venderá barateado no comércio sem limites que costura o subúrbio carioca.
– Jonathan, volta pra casa cara! Sua mãe te ama. Sua foto tá no Facebook…
Jonathan ri e acena negativamente, seguindo, aproveitando-se do fosso metalizado entre ele e o chamado sólido.
– Jonathan, por favor cara, vem cá! Volta pra casa. Sua mãe tá preocupada…
Jonathan continua inalcançável, rejeitando em gestos. A essa altura a escuta não é mais atenta. Preguiçosamente as pessoas voltam aos celulares, reclamam da demora do ramal Gramacho, compram um torresmo mequetrefe e a empada Império – R$ 1,00.
Um último apelo :
– Vou falar pra sua mãe que te vi! Vou falar pra ela !
Jonathan deu meia volta. O vendedor correu pelo seu próprio lado da estação, rindo, sacolejando os chocolates. Se encontraram no alto das escadas. Andam juntos. Quando passam por mim, escuto trechos do diálogo final:
“Você tem um dom cara, você tem dom, você tem talento, não precisa ficar na rua, não precisa nem ser vendedor como eu”.
Sumiram – um portando orgulhosamente o dever cumprido, o outro arrastando seu saco de lixo vazio. Ninguém reparou.
Por Hara Flaeschen – jornalista