Entrevista com o jornalista Ruy Portilho
Victor Viana
Foi um bate-papo rápido, não tínhamos muito tempo, e Ruy Portilho estava passeando em Búzios – hospedado na casa de seu amigo, o renomado arquiteto Octavio Raja Gabaglia, e não queríamos encher demais o cara. Mas o pouco tempo que pudemos conversar, ele, que é jornalista, passou por vários veículos, incluindo a sucursal do Estadão no Rio, e por mais de quase duas décadas coordenou o Prêmio ESSO de Jornalismo, constituiu a “RP Consultoria”, uma empresa especializada na concepção e organização de prêmios e desde então vem atendendo a diversas organizações. Foi suficiente para fazermos uma boa entrevista com informações importantes sobre o jornalismo brasileiro e o momento atual da profissão e da politica também. Quando ao final eu disse que seria uma honra pro Prensa de Babel ter a colaboração dele, ouvimos a resposta: “ Sou apenas um Caixeiro Viajante das premiações jornalísticas”.
O Prêmio Esso deixou de existir em 2015, no entanto, ainda é considerado o maior prêmio de jornalismo do Brasil. Você coordenou a premiação por 23 anos, o que aconteceu?
O Esso existiu de 1965 até 2015, foram 60 anos de história, antes da minha gestão não se contava bem os nomes dentro das categorias, isso passou a ser feito quando eu assumi. Então busquei fazer uma pesquisa e chegamos a 1400 vencedores ao longo dessas seis décadas, mas com certeza foi mais que isso. Era uma premiação gigantesca, e como qualquer premiação depende de patrocinadores. E a premiação era patrocinada pela Esso Brasileira de Petróleo, que dava nome ao prêmio. Quando ela foi comprada pela Exxon Mobil foi muito naturalque quisesse vincular seu nome ao prêmio. Mas em 2015 foi a última edição de um Prêmio que era uma instituição.
Existem outros prêmios de jornalismo no Brasil, há algum que possa ocupar o vácuo do Esso?
Não existe no momento nenhum que possa se dizer que ocupou esse lugar vago. Era o Oscar do jornalismo brasileiro, uma disputa acirrada.
O Prêmio da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) não poderia, ao menos a longo prazo, ocupar este espaço?
Pode. Inclusive foi a minha empresa que fez as linhas básicas de como deveria ser a premiação. Uma premiação que cativasse o jornalista a querer participar. Mas esbarra no fato de que precisa de uma empresa que patrocine esse prêmio, a ABI não tem como custear isso. Mas havendo investimento com certeza seria até muito legitimo que fosse a ABI a ter o principal Prêmio de Jornalismo do país.
Como era ser o chefe da sucursal de um jornal tão importante como o Estadão em uma capital igualmente importante como o Rio?
Em uma sucursal se faz de tudo. Eu era o chefe, mas se descarrilhava um trem em Cascadura de madrugada eu tinha de ir lá.
O Rio de Janeiro era importante a que ponto pro Estadão?
Mesmo naquele período o Rio não sendo mais Capital do país a cidade não perdeu até hoje sua importância. Sempre chegava um Chefe de Estado. O presidente Médici adorava vir ao Rio. Geisel tinha casa em Teresópolis.
Além do Estadão você trabalhou em outros dois veículos que já podemos chamar de lendários, pode falar um pouco deles?
Trabalhei na Revista Manchete em sua época de ouro. Uma redação cheia de grandes jornalistas. Só pra citar alguns nomes como Raimundo Magalhães Junior, professores de jornalismo como Nilson Lage. Grandes figuras. Mas também trabalhei no Jornal da Tarde, grande vespertino de São Paulo que foi criado pelo Mino Carta. Era uma formula muito nova naquele momento, ao mesmo tempo estava sendo feito uma mesma estratégia nos Estados Unidos, só ficamos sabendo disso muito depois. Era pouco texto, mas uma ótima diagramação, muita foto, muita ilustração. Era o que chamávamos de “editar pela imagem”, ganhava-se a atenção do leitor pela imagem. Jornal da Tarde no Prêmio Esso foi tão premiado quanto o Estadão.
Vindo da longa tradição do impresso como você se situa hoje nesse momento que o digital inegavelmente toma a frente de forma feroz?
Eu como qualquer jornalista sempre li o jornal físico, o impresso, mas realmente hoje os leio muito pouco. Nessa madrugada, por exemplo, perdi o sono e acordei por volta das 3 ou 4 horas da manhã e então peguei o Tablet e li toda a edição do O Globo e li também todas noticias mais recentes do UOL. Quando o dia clareou, eu já estava informado. Isso não quer dizer que o jornal impresso não vá continuar, ele vai. Claro que não com o vigor de antes, mas vai. O que acontece é que o impresso vai ganhar mais credibilidade como veiculo para um jornalismo analítico, coisa que não se vê muito na internet – que se dedica mais ao factual.
Quais veículos da internet você lê?
Tenho a assinatura digital da Folha de São Paulo e do Globo, mas eu também dou uma beliscada no Estadão. Leio também os blogs como o Antagonista, e umas lidas nos sites e blogs de esquerda, como Brasil 247 e o Conversa Afiada, só pra saber o que eles estão dizendo.
Então você é de direita?
Sim, eu sou sim.
Vota em Bolsonaro (risos)?
Não, não (risos). Não sou direita raivosa, não (risos). Deixa eu te falar uma coisa? Quando aconteceu o atentado a bomba no Rio Centro nós do Estadão – eu era o responsável pela sucursal do Rio, apuramos e demos a notícia. O pessoal da esquerda queria abafar o caso, o pessoal do Partidão. Diziam que noticiar que tinha sido milico que tinha posto a bomba ia ser exatamente o que eles (os militares) queriam pra não aceitarem a abertura democrática. Nós peitamos, bancamos e publicamos. É milico que pois a bomba? Então vamos publicar que foi milico.
Noticiar que foram os militares foi crucial pra expor a necessidade do fim da ditadura, não é?
Justamente. Fizemos o que tinha de ser feito e o resultado você conhece, não atrapalhou a abertura, na verdade ajudou.
Mesmo sendo de direita você lê o Conversa Afiada, que tem mantido uma linha mais a esquerda. Admira de alguma forma o Paulo Henrique Amorim?
Respeito o que ele faz hoje. Mesmo não concordando com os apontamentos dele eu o respeito. É uma peça importante para quem quer ficar informado de verdade sobre esse momento da politica nacional. Assim como também julgo importante que se leia canais como o Antagonista que é feito pelo Diogo Mainardi e o Mario Sabino. Os dois estão fazendo um jornalismo de direita que não existia na internet. Mas também é boa leitura o Brasil 247, que tem essa pegada de esquerda, e também acho importante sim que se leia os articulistas da Veja.
Seguindo essa linha do jornalismo digital – que é o que estamos fazendo aqui no Prensa, o que acha que faltou pro Jornal do Brasil emplacar no digital?
Primeiro é preciso lembrar que o JB antes de se tornar totalmente digital ele já investia na internet, foi um pioneiro. O que fez com que ele acabasse foi o fato de que não conseguiram reter nele os grandes nomes do jornalismo que ele mesmo gerou. Todo os bons passaram por lá, no entanto, não conseguiram manter nenhum deles. É bom lembrar que nenhum veiculo ganhou tantos prêmios Esso quanto o Jornal do Brasil.
Acha que o Prensa de Babel conseguirá?
Vai depender muito do conteúdo que vocês elaborarem. O habito de acessar um site pra se informar já se tornou real na maioria das pessoas, inclusive no interior – que é onde vocês estão sediados, mas esse hábito está lnkado com os interesses desse leito. Ele se torna fiel do veículo que tem a informação que ele quer. E existe todo tipo de leitores, que leitores vocês querem? Depende disso. A busca por informação é inerente ao ser humano. Tem mercado pra vocês sim, vai depender de vocês.
Você sabia que o jornal O *Perú Molhado (onde os dois fundadores desse jornal digital trabalharam) concorreu ao prêmio Esso de Jornalismo na categoria projeto gráfico?
Claro. Eu que aceitei a entrada do Perú Molhado para concorrer com a capa, que era muito criativa mesmo. Essa capa foi muito discutida, não chegou a final, mas era mesmo muito interessante.
*Em 2006, os brasileiros assistiam a campanha eleitoral com dossies, dólares na cueca e muita corrupção. Para ajudar o povo na hora do voto o Perú disponibilizou um saquinho de vômito para todos os seus leitores. Com essa capa o, O Perú concorreu pela segunda vez ao Prêmio Esso de Criação Gráfica – Categoria Jornal. A capa foi ideia do Sandro Peixoto: Lula era candidato a reeleição para presidente (Marcelo Lartigue – editor do semanário, estava viajando) e Hamber Carvalho (advogado e jornalista que chegou a se presidente do PT em Búzios) tinha escrito um texto puto com o Lula por causa do escândalo do Mensalão, que estava no comecinho. Sandro então colocou uma foto do Lula com uma expressão peculiar na Capa do jornal, e depois de impresso toda a redação trabalhou duro colando uma saquinho de vomito abaixo da boca do presidente. Na capa também vinha escrito “Vomite seu voto aqui”. Tudo isso foi feito sem que Marcelo soubesse.
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