A situação de Rafael Braga persiste. Militantes atônitos assistem as decisões dos desembargadores sem ter muito o que fazer, apesar dos apelos de hastags, manifestações e organizações diversas. Há um aprendizado óbvio de que o país é racista, juntamente com seus magistrados e legisladores.
Além disso, casos como o de Rafael Braga são mais corriqueiros do que se imagina. Presos temporários, injustificados e cadeias lotadas são um cenário comum, corriqueiro e insosso na nossa rotina diária.
Agora diante das mobilizações possíveis, a sensibilidade daqueles que poderiam mudar essa situação continua inerte, e aí? Quais seriam os próximos passos para que Rafael Braga seja solto e a reboque, casos similares sejam julgados de maneira justa?
Existe uma súmula corrente no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, a chamada súmula 70. O que seria a súmula 70? As súmulas são determinações feitas em caráter de regra para serem seguidas pelos juristas de determinado tribunal. No caso, a súmula 70 rege o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e logo, suas condenações.
“O fato de restringir-se a prova oral a depoimentos de autoridades policiais e seus agentes não desautoriza a condenação”. Entende o fio da meada? O juiz, desembargador, que seja, pode condenar alguém com base exclusivamente no depoimento do policial em questão.
Através da súmula 70, Rafael Braga é condenado. Através da súmula 70, muitos dos nossos estão presos e o fato de isso não ser minimamente discutido dentro da nossa militância me deixa apreensivo.
Porque além de qualquer campanha, precisamos entender que estamos lidando com um aparato sofisticado de leis, julgamentos e instrumentos que nossa mera verborragia não resolve mais. A nossa instrumentalização e consequente balizamento para travar todas as formas de recursos contra os nossos, precisa ser pauta, urgentemente.
Entre passeatas fascistas, instituições que são financiadas por grandes corporações para minar direitos e acesso em prol do livre mercado, sucateamento contínuo da educação e assassinatos diários de pessoas, nossa reserva de poder, deixando o Brasil em nível de guerras seculares, ou a gente se instrumentaliza e entende o que estamos enfrentando, ou cairemos pesadamente.
Como derrubar a súmula 70? Entenda, a luta não pede ingenuidade nossa. Continuemos…
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Entenda o caso de Rafael Braga (Adendo do editor)
Rafael Braga Vieira, de 25 anos, completa nesta sexta-feira um ano de prisão. Até hoje, ele é a única pessoa julgada e condenada por crime relacionado a protestos no Brasil. Vieira é negro, morava na rua e usava crack.
Sua detenção ocorreu após a manifestação do dia 20 de junho de 2013, quando milhares de pessoas tomaram o centro do Rio de Janeiro no embalo dos protestos contra o aumento das passagens de ônibus.
Ele levava consigo duas garrafas de produtos de limpeza – água sanitária e desinfetante Pinho Sol – consideradas “artefato explosivo ou incendiário” pela polícia e pelo juiz responsável pelo caso.
Vieira afirma que não participava do protesto e não tinha relação com os manifestantes.
Em seu depoimento, Vieira disse que estava a caminho de encontrar uma tia quando teria sido abordado por dez policiais. A abordagem, segundo ele, teria ocorrido assim:
“Vêm cá, ô moleque”
“Aí neguinho… ô moleque. O que você tem aí?”
“Ah, cara, você tá com coquetel molotov?”
“Você tá ferrado, neguinho”.
Vieira diz ter respondido que não sabia o que era coquetel molotov. Na sequência, afirma ter sido agredido no estacionamento da delegacia.