O show do rapper mais conhecido do país mostrou mais uma vez o valor do Fishbone para Búzios
Não era a primeira vez que o Pensador iria cantar em Búzios, e nem no Fishbone. O show dele em 2013 foi épico. Mas a notícia de que ele estava de volta ao balneário tem um frescor para quem mora, e uma importância na manutenção de um conceito de cidade, em que apresentações como estas encaixam com perfeição. “É a cara de Búzios”, “É o formato de show que temos que ter sempre”, “Só o Fishbone para proporcionar isso”, eram as frases mais ouvidas entre moradores e visitantes mais frequentes.
No último sábado (11), o ‘esquenta’, que começou às 15h30, ficou por conta dos DJs residentes: Help, Soneca e Pedro Trindade, que realmente deixaram a moçada presente azeitada pra quando Gabriel entrasse no palco, colocando a galera no bolso aos primeiros beats de ´Pátria que me Pariu´. E para mostrar logo de cara que não era um show só pra quem foi adolescente ou jovem na década de 90 e idos de 2000, o rapper mandou ‘Linhas Tortas”, do album “Sem Crise de 2012” e uma galera na faixa dos 16 aos 18 anos sobressaiu cantando com emoção. Tanta que foram puxadas pro palco e levadas ao delírio cantando junto o refrão “Eu vivo de escrever! Eu vivo de escrever!”.
Daí em diante veio uma sequência de canções do ´Quebra Cabeça`, álbum que vendeu um milhão de cópias em 1997 e que todos os presentes cantavam as letras de cor. Mas o momento em que a atriz e cantora Anna Lima, com quem foi casado e tem dois filhos, de surpresa entrou no palco para relembrar a sacana ‘1234 meia78’, colocou os saudosistas em êxtase e toda a praia de Geribá (tinha gente na parte de fora escutando da areia) para gritar o icônico refrão “…Tá na hora de molhar o biscoito!”. Davi, o caçula do Pensador, também participou, fazendo beat box. O pai estava visivelmente orgulhoso.
Não houve um momento em que o Pensador parou e falou sobre política ou a situação do país, mas suas bem boladas letras de protesto (teve até a relembrança de ‘Lavagem Cerebral’ do primeiro álbum) falam por si mesmas e teve sim, durante a segunda versão de ‘Matei o Presidente’, vindo da plateia, um inevitável coro de “Ê Bolsonaro vai tomar…” e também, mesmo que bem menor, uma reação contrária. Alguns rapazes fortões e sem camisa defenderam o seu presidente, enquanto tomavam Cîroc, levantando o dedo médio silenciosamente para o alto. Em ‘Retrato de um PlayBoy- parte 2’ os mesmos cantaram mais contidos e parecendo desconfiar de algo “(…) eu tenho um pitbull e imito o que ele faz, eu era um debilóide e fiquei ainda mais”.
O Fishbone fica de frente para a praia mais badalada de Búzios: a linda, a maravilhosa, salve! Salve!, Geribá. E então alegrando com ‘Solitário Surfista’ (voltando ao ‘Sem Crise’), emocionando com ‘Astronauta’ e ‘Pra onde vai o sol’ (ambas do ‘Quebra Cabeça’) ele mandou ‘Palavras Repetidas’ do álbum ‘Cavaleiro Andante’ e todos quase que se abraçaram para cantar junto o sample de um refrão clássico da Legião Urbana:“É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã”.
Pensador chamou o rapper Negro Z, de Saquarema, pra cantar com ele, e subiram também amigos surfistas de Rio das Ostras. Mostrou que conhece bem a Região dos Lagos, em especial suas praias e suas principais figuras. Foi um show de vibe boa, simples, feliz e bonito, estilo Fishbone mesmo: diversidade na plateia, alegria e educação, marca desse lounge bar desde quando era um barraca de surfistas lá em 1987, quando o seu fundador Sebald, vindo do principado de Liechtenstein, chegou em Búzios, se apaixonou por Geribá e fincou nela o germe do que se tornaria uma referência em todo país: um clube de música, para reunir amigos, em um ambiente jovem e de bom gosto, em um lugar maravilhoso.
Prensa de Babel: Como é voltar a Búzios e ao Fishbone? Além dos shows você tem uma ligação pessoal com a cidade, não é?
Gabriel o Pensador: Eu já vim muito feliz e pensando na questão do Fishbone mesmo, já voltar aqui na casa. Fizemos dois shows na época e os dois foram tão bons, a galera pediu. Se eu pensar um pouquinho mais em Búzios me remete a coisas anteriores. Eu curto muito Búzios desde que era criança e adolescente. Minha mãe foi casada com o Marcos Paulo (ator e diretor da Globo, falecido em 2012), e vínhamos com frequência. Mas antes disso, eu já vinha pra casa de conhecidos, andava de skate na pista de Geribá, aprendendo a pegar onda aqui. Tenho boas lembranças: de liberdade, de curtir as praias, de ficar na rua. Sempre venho com um astral especial a Búzios.
Prensa: Durante a apresentação com as participações, entre elas o Negro Z, de Saquarema, e citações a amigos do surf. Ficou claro que conhece bem nossa região.
Pensador: Tinha amigos presentes de outras cidades da Região dos Lagos e gosto de citar a presença, curto e conheço muito bem a região. Esse cara de Saqua (Negro Z) é muito bom e aparece de vez em quando nos nosso shows. Já cantou com a gente lá no Rio, e gosto dele. Sei da qualidade dele e gostei de ver ele presente. Aqui tem muitos turistas de outros lugares do Brasil. É um encontro não só do pessoal de Búzios. É uma mistura boa.
Prensa: O rap, e a cultura Hip Hop, se popularizou no Brasil. Você começou na década de 90, levando o rap pra rádios e tvs, algo que nunca tinha acontecido no país, é sem dúvida um pioneiro. Se sente responsável por essa expansão atual da cena?
Pensador: Trabalhei pensando nisso mesmo, quando comecei a carreira. Quis mostrar o rap e o Hip Hop para um público que não conhecia. Eu tive a opção de gravar um disco na gravadora dos Racionais, porque foi eu que fui lá buscar e mostrar o trabalho e conversar. Mas quando eles me disseram que era só pro público de rap, que era bem fechada a distribuição e divulgação deles, não era bem o que eu queria tentar. Eu queria mesmo era expandir essa nossa cultura, e acabei conseguindo contrato com uma gravadora grande e acessar os programas de TV e Rádio com essa intenção mesmo. Mas aí demorou pra isso gerar frutos, para abrir portas mesmo para outros rappers e para o segmento crescer tanto. Mas me sinto sim um dos responsáveis por isso no Brasil e nos outros países de língua portuguesa.
Prensa: Verdade. Seu primeiro disco teve uma importância grande para além do Brasil
Pensador: Sim. O pessoal reconhece muito isso, da importância do meu primeiro disco quando o rappers portugueses e descendentes de outros países africanos e imigrantes estavam desistindo de fazer rap em português e começaram a fazer rap em inglês e aí apareceu meu disco. Tem muitas histórias interessantes sim.
Prensa: Depois teve o ‘É só o começo’, que era bem profundo e intenso. E se mostrou de alguma forma ser mesmo só o começo. Porque depois veio o Quebra Cabeça e aí acredito que foi mesmo a popularização do seu trabalho e também, consequentemente, do rap em grande escala. Isso?
Pensador: É por aí sim. Quando o meu terceiro disco vendeu um milhão de cópias, as gravadoras começaram a ficar mais ligadas na força do rap também, e começaram a buscar outros rappers para os seus castings de artistas, e isso ajudou bastante. As rádios começaram a tocar outros artistas da cena, porque sabiam do valor comercial, começou a tocar outros rappers, porque sabiam da força comercial do estilo.
Prensa: Escutei teu som a primeira vez com 13 anos, meu irmão mais novo, hoje com 25, começou a escutar nessa mesma idade, e agora meu filho, com 11, também está escutando você. Como é ver seu público se renovando?
Pensador: Fico muito feliz com isso que está me contando. Feliz mesmo. Teve um momento em que cantamos ‘Linhas Tortas’, uma canção muito especial pra mim, que eu curti ver umas meninas muito jovens cantando. Fiz questão de chamar as meninas pra cantar no palco, e eram bem novas as garotas. Gerações que vão passando e o pai curtindo junto com os filhos, isso me deixa feliz sim. E hoje tinha o pai e o filho no palco, né (risos). Meu filho hoje está aqui. [O filho do Pensador, Davi, participou fazendo beat box]
Prensa: Você falou de como a canção ‘Linhas Tortas’ é importante pra você, ela é bem pessoal e fala do seu amor pela literatura. Você é ganhador do Prêmio Jabuti (principal premiação de literatura do país) com um dos seus livros o “Rorbeto”. Búzios pode esperar uma próxima vinda sua, dessa vez, como escritor?
Pensador: Seria um prazer. Eu faço participação em feiras literárias ou visitas a universidades e eventos de empreendedorismo onde temos a oportunidade de fazer palestras. Geralmente é isso. Seria um prazer fazer isso aqui.
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Momento fã
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Serviço
Discografia Pensador
Endereço Fishbone: Rua Gerbert Périssé, Av. Geribá, 1196, Búzios – RJ, 28950-000/ 22 2623-3064.