O principal líder da paralização dos petroleiros, que ocorreu esse ano, logo após a paralisação dos caminhoneiros, José Maria Rangel, é pré-candidato a deputado federal pelo Partido dos Trabalhadores, o PT. Após o país todo parar pelas reivindicações dos caminhoneiros, com uma pauta mais restrita à categoria, foi a paralisação liderada por José Maria, e que ampliava as reivindicações dos caminhoneiros incluindo também baixar o preço da gasolina, gás de cozinha, e principalmente a retomada do crescimento da Petrobrás, que culminou com o pedido de demissão de Pedro Parente da presidência da empresa.
Foi uma paralização de advertência de 72 horas, onde os petroleiros liderados por José Maria Rangel tiveram o cuidado de deixar os estoques cheios, visando não prejudicar a população, mas pressionar diretamente o Governo Temer contra sua política de direcionar a Petrobrás ao mercado financeiro, com reajustes diários responsáveis por alta de 20% no preço dos combustíveis só em 2018.
Com 56 anos, José Maria entrou para a Petrobrás em 1985 como Técnico de Manutenção. Em 1993, assumiu sua primeira direção sindical no Sindicato dos Petroleiros do Rio de Janeiro (Sindipetro-RJ). Nessa época, o Sindicato do Norte Fluminense não havia sido fundado. Com o plebiscito em 1996, que originou o Sindipetro-NF, com bases em Macaé e Campos, a sua experiência e a forte atuação durante a greve de 1991 o levou à Coordenação do Sindipetro-NF em 2004, e em 2014 Coordenador da Federação Única dos Petroleiros (FUP), da qual está licenciado para concorrer para pleito de 2018.
A defesa da Petrobrás está no centro da atuação do pré-candidato, em especial defender a estatal do processo de desmonte que vem sendo realizado pelo atual governo, e que faz com que a empresa exporte quase 500 mil barris por dia, abrindo mão de refinar o petróleo no país.
“A empresa está se transformando em exportadora de petróleo e abrindo mão do mercado interno de derivados. Quem vai pagar o preço final é o consumidor”, adverte.
Retomar o crescimento da Petrobrás também é defender a Região da Costa do Sol
Mas José Maria Rangel, nesta entrevista, esclarece outras preocupações como o repasse dos royalties, empregos e desenvolvimento regional, como também educação com foco nas universidades públicas e Institutos federais para o interior do estado, como também a necessidade de investimentos em turismo e cultura. E revela dados alarmantes de desemprego tanto na Região Norte, em especial Rio das Ostras e Macaé, como também na Região dos Lagos, como Búzios e Cabo Frio. Para a solução desse, e de outros problemas do estado, é taxativo: retomar a Petrobrás pelos brasileiros e redirecionar a sua política, em especial em relação ao conteúdo local.
Prensa de Babel: É consenso de todos, ao menos nos discursos, que a Petrobras é primordial para o Brasil, como também para o Rio de Janeiro como um todo. Como podemos situar seu impacto no interior do estado, em especial no Norte Fluminense, mas também Lagos e arredores?
José Maria Rangel: Os dados de produção de petróleo e investimentos na área de exploração e produção (E&P) são um bom exemplo da redução da atuação da Petrobras na região dos Lagos e no Norte Fluminense. A produção de petróleo na Bacia de Campos – que no Rio de Janeiro compreende a região que vai de Cabo Frio até o norte do estado – atingiu 1,04 milhão de barris por dia (bpd), o menor volume alcançado desde 2001. Para se ter uma ideia, a produção média de 2015 foi 1,63 milhão bpd. De lá para cá, uma queda de 36,2%. Os investimentos da Petrobras na área de E&P saíram de US$ 25,5 bilhões em 2013 para US$ 12,4 bilhões em 2017, ou seja, caíram pela metade. Um agravante desse cenário é que, além da queda, boa parte dos investimentos nesse segmento tem sido deslocados para o pré-sal que está concentrado no sul do Rio de Janeiro e no norte de São Paulo. Com isso, é incontestável que a redução no Norte Fluminense foi ainda maior. A redução de produção e de investimentos gera um efeito em cadeia que afeta a arrecadação fiscal, a geração de emprego e o aumento da renda. Em termos de emprego, por exemplo, a cadeia de fornecedores (atividades de engenharia, apoio à extração de petróleo, produção de máquinas e equipamentos, indústria metal-mecânica etc.) que chegou a significar mais de 45 mil empregos na região, atualmente não passa 35 mil.
Prensa: Quais efeitos devastadores sobre o Rio de Janeiro, que o senhor vem afirmando em outras entrevistas, poderia elencar direcionado a região?
José Maria: A minha grande preocupação tem se centrado no emprego e na educação, embora seja obvio que o caos do estado afete todas as áreas, como saúde, segurança, cultura etc. O desemprego aqui é devastador. Nos últimos anos, o desemprego já atingiu quase 50.000 trabalhadores na nossa região. Em Cabo Frio, 2000 pessoas e, em Rio das Ostras, 4000 pessoas perderam postos de trabalho. Mas, isso é ainda mais grave no Norte do estado. Em Campos dos Goytacazes, foram destruídos quase 15000 postos de trabalho entre 2015 e 2017 e, em Macaé, pasmem, mais de 30.000. Esse número representa mais 10% da população da cidade. É um cenário desolador que só vai ser alterado com uma mudança política brusca.
Prensa: Acredita que ainda há razões para investir nos chamados campos maduros da Bacia de Campos?
José Maria: É claramente uma decisão equivocada da gestão Petrobrás deixar de investir nos Campos maduros na Bacia de Campos e não desenvolver o Pré-Sal que também está presente no nosso estado. O que tem causado grande impacto no desemprego crescente nas regiões do interior do estado incluindo a Região dos Lagos.
Prensa: Sobre seu desmonte, que faz parte de suas denúncias e atuação, pode dar um panorama de como a situação pode ficar diretamente aqui na chamada Costa do Sol? Pode piorar?
José Maria: Os dados econômicos e de mercado de trabalho também tem afetado a região da Costa do Sol. A questão que precisamos deixar claro é a seguinte: o setor petróleo tem um forte encadeamento com as atividades econômicas de toda a região, ou seja, os trabalhadores petroleiros consomem bens e serviços da região e são uma importante fonte de demanda para restaurantes, hotéis, lojas etc. A saída desses trabalhadores afetam diversas áreas, como alimentação, turismo, serviços básicos etc.
Prensa: Búzios sofreu impacto no seu turismo por conta do fim de postos de trabalho ligados ao setor do petróleo em Campos e Macaé. Está ciente disso?
José Maria: Sim, estou e isso mostra o quanto defender a uma política na Petrobrás que não deixe lado a Bacia de Campos favorece também a Região dos Lagos. Como eu disse anteriormente, somente em Cabo Frio nos últimos três foram destruídos mais de 2000 postos de trabalho, que envolvem desde de trabalhadores da construção civil até pescadores e profissionais de atendimento ao público. Aparentemente são setores que não teria ligação com o petróleo, mas boa parte das pessoas que demandam esses segmentos são do setor petróleo. E isso não se resume a Cabo Frio, em Rio das Ostras, no mesmo período, foram destruídos mais de 4000 empregos. Ou seja, é um fenômeno estrutural e que afeta todas as cidades e toda a sua população.
Prensa: Sobre isso gostaria de trazer o fato de que a queda na arrecadação dos royalties atinge além de Macaé e Campos, que estão mais diretamente ligados a exploração do petróleo, mas também atinge municípios como Búzios e Cabo Frio. Mas esses municípios muitas vezes parecem passivos ao processo, como coloca-los também como protagonistas nessa discussão?
José Maria: Como mencionei anteriormente, a região de Cabo Frio e Búzios tem potenciais econômicos em turismo que devem ser aproveitados. Além disso, são regiões bem próximas ao cerne da produção da Bacia de Campos e também podem abrigar atividades ligadas ao complexo petrolífero, como educação profissional e superior, hotelaria para plataformas etc. Isso demandariam investimentos de outra natureza, que não dependem dos royalties. Ou seja, os investimentos em universidades e escolas técnicas não estão associados ao ciclo dos royalties e, em tese, não são afetados com as mudanças no preço e na produção do petróleo. No entanto, quero reafirmar a minha preocupação com a gestão dos royalties. Eles devem ser pensados para o futuro e, por isso, para geração de atividades econômicas que ajudem a sustentar o desenvolvimento da região no longo prazo. É importante um diálogo amplo com os municípios para definir prioridades e critérios rigorosos de utilizar os recursos no longo prazo. Os royalties são uma compensação para o futuro e não para realizar obras no presente
Prensa: Não vai adiantar investimentos isolados por parte de cada município afetado se a Petrobrás não retomar seu protagonismo econômico?
José Maria: A retomada da Petrobras é condição indispensável para retomar o seu dinamismo econômico.
Prensa: Há recursos para isso?
José Maria: É preciso que a população tenha a clareza que a Petrobras tem recursos sim – somente em 2018 a empresa arrecadou mais de R$ 158 bilhões com receitas da sua atuação (um crescimento de 17% em relação ao ano passado) – e condições técnicas para manter suas atividades na região. A Bacia de Campos ainda apresenta volume expressivos de reserva de petróleo, mas necessita de maiores investimentos em técnicas especificas para aumentar a produção e reverter esse ciclo de queda que vem ocorrendo nos últimos dois, três anos.
Prensa: Como se pode reverter esses recursos de volta para o crescimento de nossa região?
José Maria: Isso precisa voltar a ser uma prioridade da empresa o que, obviamente, impulsionaria a geração de emprego, renda e de arrecadação para os municípios da região do Costa do Sol. Ou seja, não há solução para o estado do Rio e suas regiões sem mudar a forma como a Petrobrás está gerindo seus investimentos.
Prensa: Muito se fala sobre o petróleo ser um recurso finito, e sobre a busca de novas alternativas que amorteçam a sua falta em um futuro ao menos a médio prazo. No seu pensamento outras iniciativas, além da exploração do petróleo, para essa região do estado?
José Maria: Sem dúvidas! O petróleo é um passaporte para o futuro. Os investimentos da Petrobras são fundamentais para retomar a atividade econômica no curto prazo, no entanto, seu recurso também deve ser pensado para fomentar outras potencialidades regionais. Por isso, tenho extrema preocupação com a gestão dos royalties e das participações especiais que devem ser utilizados para desenvolver novas atividades que garantam o desenvolvimento da nossa região no médio e longo prazo. Além disso, a partir da Petrobras, é possível aproveitar os investimentos já realizados para desenvolver novas fontes de energia, como eólica.
Prensa: Saindo da esfera energética, o que poderia elencar?
José Maria: Nossa região tem um potencial imenso nas atividades turísticas, de pesca e no setor agrícola. Devemos adotar medidas, como incentivos financeiros e fiscais, acesso ao crédito, para estimular os pequenos empreendimentos desses setores que também tem grande potencial para gerar emprego e valorizar nossa cultura local.
Prensa: Como pode ser feito um desenvolvimento regional integral a partir do levante da classe trabalhadora no interior do estado?
José Maria: Os movimentos sociais e os trabalhadores devem ser envolvidos para se discutir o futuro da região. O dialogo social com todos os setores, não só trabalhadores, é fundamental para se construir prioridades para o futuro. Minha atuação sempre prezou por ouvir os trabalhadores e não seria diferente agora. Acredito que há outros interesses que limitam e participação popular na construção de prioridades para o futuro que, de fato, gerem desenvolvimento para nossa população. E no caso da nossa região, isso é mais forte, porque temos um recurso gigantesco (os royalties e as participações especiais) que são gastos sem qualquer envolvimento da população e, pensando sempre, o dia seguinte dos gestores locais. Temos de ter um processo não só integrado, mas que olhe para o futuro. O petróleo ainda é e será durante um tempo o motor do nosso desenvolvimento, mas ele não é eterno. Ele deve ser pensando como uma compensação para o longo prazo. Só o povo é que pode apontar caminhos para o futuro e definir as prioridades necessárias para a melhora da sua vida.
Prensa: Acredita no retorno de investimento das três instâncias do governo?
José Maria: A exemplo do que ocorreu no governo Lula, a atuação das instâncias municipal, estadual e federal é fundamental para potencializar a atuação da Petrobras na região. Os investimentos, por exemplo, em qualificação profissional dependem de programas do governo federal, como aconteceu com o Prominp, e do aumento das escolas técnicas nos municípios para captar os recursos e organizar o sistema de ensino local. Além disso, a atração de empresas nacionais para fornecer à Petrobras pode ser reforçada com subsídios fiscais, créditos preferenciais que o estado pode articular. Isso sem contar nos investimentos das nossas universidades federais e estaduais que são parceiros tecnológicos centrais para a Petrobras. Ou seja, você tem alternativas em várias frentes para todas as esferas da federação visando potencializar os investimentos locais e criar uma sinergia positiva com a Petrobras. A questão é definir isso como prioridade e ter vontade política de fazer. Só novos governos democráticos e populares poderão estabelecer essas prioridades.