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Reflexão de quinta: “Erguendo-nos enquanto subimos”

A intelectual e ativista Angela Davis, ícone da luta por direitos civis, autora de vários livros que problematizam as desigualdades sociais e a submissão humana, em discurso apresentado na Conferência anual da Associação Nacional de Estudos Sobre Mulheres em junho de 1987 em Spelman College, intitulado “Vamos subir todas juntas: perspectivas Radicais sobre o Empoderamento das Mulheres Afro-americanas”, publicado no livro “Mulheres, Cultura e Política” afirma que o conceito de empoderamento não é uma novidade para as mulheres afro-americanas e narra o nascimento do movimento pelo direito das mulheres negras nos Estados Unidos.

Questionarão sobre qual a necessidade de um movimento feminino composto por mulheres negras, já que todas são mulheres. De fato, todas são mulheres e vítimas da opressão machista, porém, as mulheres negras além de enfrentarem a misoginia, o ódio, o desprezo, que se manifesta através da exclusão social e da discriminação, ainda têm que enfrentar o racismo, ou seja, nós somos atingidas por várias opressões, também conhecido como interseccionalidade.

Entende-se o racismo como um princípio de opressão que visa negar direitos e até mesmo a humanidade de um grupo com base na cor da pele, resultado de um projeto de dominação, inaugurado pela corrida colonial europeia. Forja-se um conjunto de crenças, teorias e ideologias que hierarquizam raças e relegam os negros a subalternidade em todas as dimensões da vida social.

Angela Davis nos chama a atenção que ao longo das últimas décadas do século XIX, o movimento de mulheres era racialmente homogêneo, logo refletindo os interesses das mulheres brancas e de classe média em detrimento das demandas das mulheres negras, trabalhadoras e das classes menos favorecidas. Cria-se assim a necessidade das mulheres negras instituírem sua própria associação.

Em 1895, centenas de mulheres se reuniram em Boston, sob a liderança de Josephine St. Pierre Ruffin, para discutir a criação de uma agremiação de mulheres negras. Aponta Davis: “Em comparação com suas colegas brancas, as mulheres afro-americanas que instituíram esse movimento associativo nacional, articularam princípios de natureza mais evidentemente política. Elas definiram como função primordial de suas agremiações, a defesa ideológica e militante de mulheres negras – e de homens negros – contra os danos causados pelo racismo.”

No ano seguinte, foi criado a Associação Nacional das agremiações de mulheres de cor, cujo lema era: “Erguendo-nos enquanto subimos”. O lema é um reconhecimento de demandas distintas entre as diferenças de classe e cor, porém um chamado para unirmos forças e lutarmos juntas contra todas as formas de opressão. Diz Davis: “O processo de empoderamento feminino será mais consistente e tangível pela adoção desse princípio. Precisamos nos esforçar para erguer-nos enquanto subimos. Em outras palavras, devemos subir de modo a garantir que todas as nossas irmãs, independente da classe social, assim como todos os nossos irmãos, subam conosco.”

A autora nos diz que esse lema contempla os interesses e aspirações, frequentemente desarticulados, de massas de mulheres de todas as origens raciais. E que o empoderamento dessas mulheres “historicamente submetidas à invisibilidade” devem ser incluídas na luta geral pelos direitos das mulheres. “(…) nós mulheres de minorias étnicas devemos estar dispostas a recorrer à unidade multirracial (…) devemos proclamar: nós não estabelecemos limite de cor. O único limite que estabelecemos se baseia em nossos princípios políticos. Sabemos que o empoderamento das massas de mulheres deste país nunca será alcançado enquanto não tivermos êxito em deter a maré de racismo.” Desta forma, é importante sim um feminismo negro, mas também a unidade para batalharmos contra o “inimigo comum” que se opõe a luta por igualdade.

A leitura das obras de Angela Davis me permite pensar o Brasil de 2019, a partir de uma nova perspectiva, claro que guardando as devidas proporções. Um Brasil que deu passos largos em direção a significativas mudanças nas condições socioeconômicas das mulheres e da população negra, através das cotas nas universidades, leis que visam a redução da violência contra mulher, proporcionou o empoderamento das mulheres e das mulheres negras, conceito novo para as irmãs da América do Sul.

Estamos em um momento crítico em que o projeto do governo atual visa a destruição e usurpação dos avanços, direitos e garantias até aqui duramente conquistadas. Precisamos seguir o conselho de Angela Davis a fim de nos associarmos para minimizar as assimetrias. Necessitamos unir forças, independente da classe, cor e gênero para lutarmos contra as formas de opressão presentes em nossa sociedade, com objetivo de que “um dia seremos capazes de redefinir os elementos básicos da nossa opressão como inúteis resquícios do passado.”

 

*Renata Souza é Bacharel em Sociologia e Mestra em Sociologia Política

 

Noticiário das Caravelas

Coluna da Angela

Angela é uma jornalista prestigiada, com passagem por vários veículos de comunicação da região, entre eles a marca da imprensa buziana, o eterno e irreverente jornal “Peru Molhado”.

Coluna Clinton Davison

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