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Quem NÃO vai pegar este novo Coronavírus?

Por Mark Zusman

Vai ser feio, este comentário. Revoltante. Vai se incompatibilizar com o nosso sentido de justiça. Mas há pessoas que ainda dizem que o COVID-19 não escolhe favoritos, que age de uma forma totalmente aleatória, que pega uma pessoa desse grupo ali e outra pessoa desse grupo aí – absolutamente sem preconceito. Democraticamente. Num certo dia, aqui em Búzios, semana passada, havia um total de cinco casos confirmados. Todos os cinco sofredores caíram na faixa etária de 25 a 47 anos. Machos e fêmeas em proporções tão iguais quanto possível numa população de número ímpar. (Três na primeira categoria, duas na segunda.) E também não havia aglomerações geográficas desproporcionais. Havia casos espalhados pelos bairros de Tucuns, Bosque de Geribá, Manguinhos e Cruzeiro. Favoritismo? Não pelas aparências. 

Reprodução da pintura “Juízo Final”, de Michelangelo

Mesmo assim, eu sou norte-americano de origem, e, confesso, continuo lendo a imprensa anglófona com mais atenção do que a imprensa local, sobre tudo nesta época de praga, e lá, na imprensa norteamerica, encontro motivos à beça para acreditar que o COVID tem os seus favoritos, sim, e que há categorias, também, em que o vírus se interessa muito menos. Um artigo no The New York Times listou, por exemplo, as principais comorbidades em pessoas mortas pelo coronavírus, as comorbidades sendo as condições médicas no plano de fundo atrás de qualquer causa de morte preenchida numa certidão de óbito. No caso das mortes por COVID-19, em ordem descendente de frequência, as comorbidades principais são hipertensão, colesterol alto, doença arterial coronária, demência, fibrilação atrial, doença pulmonar obstrutiva crônica, patologia renal, câncer, e insuficiência cardíaca congestiva. Se a obesidade não aparece na lista, é só que a obesidade não é considerada uma doença exatamente, não pelo menos lá nos obesos EUA. Mas, porque o COVID ataca os pulmões, muitos médicos se surpreenderam pela não aparência de asma da lista. (Porque os asmáticos já controlam os seus sintomas com esteroides e inaladores?) De qualquer forma, se você é asmático (ou artrítico ou autista), não é que você não pode pegar o novo coronavírus, é só que o vírus se focaliza menos em você do que nos hipertensos, etc. Ouso dizer: Parabéns?

A obesidade não é uma doença? A obesidade é uma doença? De qualquer forma, parabéns para os mais magros. Estava prestes a clicar em “send” para encaminhar este comentário à redação quando um amigo lá fora chamou minha atenção a um novo artigo no The New York Times, agora indicando que a obesidade é o segundo maior fator de risco para internação pelo COVID, após somente a idade avançada. Segundo a Dra. Leora Horwitz, diretora do Centro para Inovação em Saúde e Ciência de Entrega num dos principais hospitais em Nova York, “A obesidade contribui mais para a internação do que a hipertensão e diabetes e é mais importante do que a doença coronária ou câncer ou a doença renal ou mesmo a doença pulmonar.”

Mas vamos agora para a distribuição por faixa etária, e lá vamos descobrir, primeiro, que os jovens e mesmo as crianças não passam incólumes exatamente. Segundo o que li num artigo cheio de estatísticas no conceituado jornal on-line VOX, no dia 23 de março (em www.vox.com/2020/3/23/21190033/coronavirus-covid-19-deaths-by-age), só 129 crianças até nove anos de idade figuravam entre os primeiros 28.600 casos confirmados na Espanha. (Menos do que um e meio por cento.) Só 34 desses 129 foram internados, e nada mais do que um desses 34 acabou na UTI. Nenhuma criança até nove anos de idade morreu. Segundo o VOX, os dados para Itália, China, Coreia do Sul e Estados Unidos eram semelhantes. Mas isso não significa que as crianças não pegam o vírus. Segundo o jornal Pediatrics, citado no artigo postado pelo VOX, um estudo na China mostrou que muitas crianças pegam o vírus, sim, mas as crianças ou não manifestam sintomas ou só manifestam sintomas brandos, e, na ausência de testagem aleatória em massa, é difícil avaliar a suscetibilidade da criançada com precisão.

Para entendermos os riscos por faixa etária, temos então que reformular a pergunta no título acima. Por enquanto, não queremos saber quem não vai pegar o vírus, queremos saber quem não vai morrer do vírus, e, nesse quesito, é claro que as crianças não vão morrer em grande número, embora os recém-nascidos sejam um pouco mais em risco do que os seus irmãos mais velhos e uma menina de cinco anos morreu no estado norte-americano de Michigan neste último fim de semana. Quem estão bem em risco são os velhinhos. Dos primeiros 6.152 casos em pessoas acima de 70 anos na Espanha, 3.388 (ou seja, 55%) foram internados, 199 foram para a UTI, 705 morreram. Em geral, o risco aumenta com cada ano de idade. Parabéns para os jovens. Pêsames para a família da mínima Skylar Herbert. Pelas fotos, uma queridinha. (Para uma análise do risco por faixa etária e por comorbidade em português, e com alguns dados brasileiros, veja a página https://www.poder360.com.br/coronavirus/conheca-a-faixa-etaria-dos-mortos-por-covid-19-no-brasil-italia-espanha-e-eua/ no excelente site PODER360 de Fernando Rodrigues. Os dados lá diferem um pouco dos dados no VOX. Lá, por exemplo, a obesidade é contada, sim, entre as comorbidades, e, segundo PODER360, “No Brasil, 85% dos mortos reportados têm mais de 60 anos.”)

Os homens aparentemente estão mais vulneráveis do que as mulheres. Isso não significa que, se você é mulher, você não vai pegar e, se você pegar, você não vai morrer. Um artigo na revista Medical News Today, no dia 15 de abril (em https://www.medicalnewstoday.com/articles/sex-differences-in-covid-19), relata, de fato, que, na Espanha, os casos confirmados em mulheres superam os casos em homens numa proporção de 51 a 49; no Canadá, em 52-48; na Suíça, em 53-47; na Coreia do Sul, em 60-40. Itália, Peru, China, Austrália e Grécia reportam, em contrapartida, mais casos entre homens do que entre mulheres. Mas a Dinamarca e a Grécia reportam uma taxa de mortalidade entre os homens de 2,1 vezes a mortalidade entre mulheres; Irlanda, de 2 vezes; Itália e Suíça de 1,9 vezes; China, de 1,7 vezes. (Resposta imune mais vigorosa em mulheres? Menos álcool? Menos cigarros?) De qualquer forma, parabéns para as mulheres.

Reprodução da pintura “Juízo Final”, de Michelangelo – Os salvos

E agora chegamos a umas distribuições mais feias, porque, enquanto as distribuições por idade e sexo pareçam ser de certa forma naturais, as distribuições despropocionais por cor da pele e renda têm origens inequivocamente sociais. Como eu disse, não estou acompanhando o progresso do nosso flagelo tanto na imprensa brasileira quanto na imprensa anglófona, mas lá nos EUA a escala da morbidade entre negros, em contraste com a morbidade entre brancos, é escandalosa – e tanto mais porque, no início da epidemia, havia boatos no sentido de que os negros eram de alguma forma ou outra imunes. (Adeptos em inglês, leiam o artigo “Stop Blaming Black People for Dying of the Coronavirus” na The Atlantic em https://www.theatlantic.com/ideas/archive/2020/04/race-and-blame/609946/.) Muitos estados norteamericanos ainda não desagregam a morbidade e mortalidade causadas pelo vírus por cor de pele ou etnicidade, mas sabemos já que, na cidade de Chicago, a terceira maior dos EUA, os Afrodescendentes constituem menos do que um terço da população mas mais do que a metade testando positivo para o vírus e 72 por cento das mortes. (Anglófonos, vejam o artigo “Black Americans Face Alarming Rates of Coronavirus Infection in Some States” no The New York Times em https://www.nytimes.com/2020/04/07/us/coronavirus-race.html e bejam o gráfico horripilante em https://apnews.com/8a3430dd37e7c44290c7621f5af96d6b.) Acho que não vou parabenizar os brancos, porque os brancos de certa forma entram no jogo com um baralho de cartas marcadas e os brancos têm um excesso de outras vantagens.

Reprodução da pintura “Juízo Final”, de Michelangelo – Os condenados

Se você não é profisional de saúde, nem médico nem enfermeiro nem socorrista, as suas chances de evitar o vírus são melhores do que os que trabalham em hospitais e clínicas. Se você tem dinheiro no banco e não tem que sair para ganhar a sua vida, as suas chances de não pegar o vírus são melhores do que as das pessoas que têm que usar os transportes públicos e interagir o dia todo com colegas e clientes. Muitas dessas desigualdades não são lindas, mas um dos raros benefícios da situação atual é que uma luz intensa está sendo lançada nessas desigualdades e estamos sendo obrigados a pensar nelas. Obviamente, as pessoas com imunidade, ou com sistema imunológico forte o suficiente para prevalecer sobre o vírus, têm uma vantagem enorme sobre as pessoas sem imunidade, ou sem um sistema imunológico forte, mas, ao que eu entenda, é difícil saber quem goza da imunidade,ou de defesas, e quem não. A imunidade não é uma característica tão facilmente confirmada quanto, digamos, idade ou sexo. Obviamente também, quem tem o luxo e a vontade de se isolar totalmente tem provavelmente as melhores chances, apesar de qualquer outro fator de risco, de evitar o vírus.

Coragem!

Noticiário das Caravelas

Coluna da Angela

Angela é uma jornalista prestigiada, com passagem por vários veículos de comunicação da região, entre eles a marca da imprensa buziana, o eterno e irreverente jornal “Peru Molhado”.

Coluna Clinton Davison

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