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Por uma outra Cabo Frio por Carolina Conceição

 

Nos últimos vinte anos o slogan utilizado pela prefeitura da cidade de Cabo Frio, tem sido a “a cidade para o cidadão”. Dentro dessa ótica, foram criados alguns projetos, ao longo desses anos, que sustentassem tanto para os moradores quanto para os turistas, essa boa imagem da cidade, tais como: café do trabalhador, passagens de ônibus a um real, projeto “novo cidadão”, que incluiu aulas gratuitas nas áreas esportivas e culturais. Tudo isso fomentado pela “era dos royalties do petróleo”, que prometia um presente digno e um futuro próspero. Porém, vinte anos depois vemos uma prefeitura envolta em dívidas, escândalos de corrupção; uma cidade falida, com seus servidores sem pagamentos, com escolas sem alunos e professores, com hospitais capengas, com uma segurança pública ineficiente e uma população descrente. Mas o slogan não mudou.

Cabo Frio: a cidade para o cidadão?

Nasci em Cabo Frio há 32 anos atrás. Há 30 anos moro no bairro Jardim Esperança, um bairro da área periférica da cidade, com ares de comunidade, e com uma numerosa população de classe trabalhadora. Mesmo com todas as dificuldades observadas aqui no meu lugar, passei a infância e parte da adolescência acreditando que vivia no “paraíso das cidades”, assim como meus pais, que trabalharam com funcionários contratados e terceirizados da prefeitura, pois essa era imagem que vendiam e que muitos de nós comprávamos. No meu caso, em particular, posso afirmar que vivenciava duas realidades, por ter estudado na rede privada e em escolas centrais, o meu imaginário era ainda mais falsamente construído, pois acreditava que meu bairro ia ser, um dia, igual ao centro da cidade, das fotos dos jornais e da televisão.

Foto do café do Trabalhador – Blog Alexandro Texeira

E posso falar da falência da cidade, exemplificando com a falência dos meus pais. Como foi dito acima, ambos eram funcionários da prefeitura nesse período de 20 anos que teve apenas dois prefeitos, e ambos compraram a ideia que os venderam, afinal, pobre não tem muita escolha. Minha mãe era professora contratada e contribuiu por longos anos a educação da cidade, em várias escolas, mas lecionou por mais tempo na escola Pedro Jotta, na zona rural da cidade; com a “crise dos royalties” instaurada perdeu seu emprego. Meu pai é pintor de profissão, mas trabalhou na prestação de serviços ao longo desse período, quando veio a crise sua empresa foi dispensada da noite para o dia, junto com uma dívida que nunca foi paga. Esse é um retrato de muitas famílias cabo-frienses atualmente.

E me pergunto: se essa cidade realmente fosse nossa?

Desde meados da década de 90, a cidade apresenta sua economia baseada no turismo, e no setor de comércio e serviços (em sua maioria também ligados a atividades turísticas), como hotéis, pousadas, aluguéis para temporadas e locais estratégicos para entretenimento dos visitantes. Este fato ocorre em função de investimentos tanto do setor público, quanto do setor privado, pois ambos pretendem construir uma imagem-síntese , a cidade com a “vocação turística” apta para competir e atrair investimentos, garantindo a sua participação na “guerra dos lugares”, característica das cidades médias.

A formação desta imagem da cidade de Cabo Frio faz parte de um processo de reconstrução do seu espaço urbano, uma simultaneidade de alterações em sua forma e função, atendendo as mudanças impostas pelo período vigente da mundialização dos capitais, que destrói barreiras e refuncionaliza os lugares. Sendo assim, os atores hegemônicos tratam de engendrar novas dinâmicas ao espaço, que no caso de Cabo Frio fica luzente em sua paisagem.

Os últimos dois governos tiveram como característica a implementação das formas urbanas, ambos investem maciçamente na limpeza e ornamentação da cidade, na construção de marcos simbólicos que compõem a criação desse novo imaginário, que é o de “cidade mais limpa do Brasil” e a “cidade para o cidadão”. Em relação à limpeza houve a setorização cromática dos bairros, em que empresas terceirizadas se encarregam de limpar as ruas e pintar os meios fios, cada bairro demarcado com cores diferentes.

Houve calçamentos, pavimentações, tratamento de esgotos. Já em relação ao comprometimento com o cidadão foi construído na Estrada dos Passageiros (na altura do bairro Jacaré) o “Café do Trabalhador”, tal qual o cidadão que acordava de madrugada para trabalhar tinha como opção adquirir seu café da manhã. Além da “festa Nordestina” que acontecia anualmente no bairro Jardim Esperança, em homenagem aos trabalhadores nordestinos que moram na cidade. Assim como a revitalização da “Rua dos Biquínis, revitalização da orla da praia do Forte, a construção da “Praça das Águas” e da “Praça da Cidadania”.

Mas, tais fatos requerem mediações, todas essas obras de infraestrutura funcionam como ideologia, algo que é tão caro ao olhar dos moradores da cidade. As reais intenções, mesmo que de alguma forma houve melhorias, são para dar sustentabilidade ao crescente fluxo de turistas que aumenta a cada ano e a necessária demanda de atrativos para investimentos externos. Porém, temos observado um turismo ineficiente no que condiz a geração de ganhos para o município.

Então, se a cidade fosse nossa, se fosse a tão falada cidade para o cidadão, não estaríamos em constante estado de greve, reivindicando nosso próprio espaço.

E é possível dizer que a possibilidade de mudanças está nas trocas cotidianas, nas ruas, nas greves, nos saraus, nas manifestações, nas redes, em que periferia e centro se fundem na busca de autonomia, não nos deixando levar mais por ideologias populista e provincianas, que não nos representam enquanto cidadãos.


  • Carolina Conceição é Professora de Geografia na rede de ensino estadual de Rio das Ostras

Noticiário das Caravelas

Coluna da Angela

Angela é uma jornalista prestigiada, com passagem por vários veículos de comunicação da região, entre eles a marca da imprensa buziana, o eterno e irreverente jornal “Peru Molhado”.

Coluna Clinton Davison

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