O local é conhecido como Mata do Centrinho e pertence ao Plano Municipal de Conservação da Mata Atlântica. O Ministério Público Estadual pediu a suspensão das intervenções no local
Durante o trabalho de pesquisa das espécies da fauna e flora na Mata do Centrinho, área que pertence ao Plano Municipal de Conservação da Mata Atlântica, localizada na Baia Formosa, em Búzios, pesquisadores identificaram a abertura de trilhas e desmatamento no local que seria usado pela Prefeitura para a construção do novo cemitério do município. Até então o Conselho Municipal do Meio Ambiente e os órgãos de pesquisa não tinham conhecimento do caso. Preocupados com a preservação da área, levaram o assunto ao Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), que pediu a suspensão das intervenções no local.
Segundo o relatório técnico feito pelo biólogo e Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, Haroldo Cavalcante de Lima, e encaminhado ao MPRJ, a área planejada para essa construção do cemitério é rica em diversidade, com presença de espécies endêmicas e ameaçadas de extinção, inclusive havendo registros da presença de pau-brasil e mico leão dourado e, também, de felinos, como jaguatirica. Além disso, se trata de uma área com importante fragmento da Mata Atlântica, uma das poucas ainda conservadas no país e que não pode ser mexida sem autorização dos institutos renomados.
“Essa área foi uma das primeiras áreas a ser mapeada pelo Jardim Botânico, existindo no local indivíduos de pau-brasil com significativo porte de altura, bem específico do local. Há outras áreas no entorno já degradadas, passíveis de serem utilizadas para a construção do cemitério, sendo importante a avaliação de alternativas locacionais no processo de licenciamento”, disse um trecho do relatório.
Ainda segundo o documento, “não houve prévia manifestação do Conselho Municipal de Meio Ambiente sobre o licenciamento e também não houve avaliação de alternativa locacional”. Além disso, destacou que “o solo local não é adequado para implantação do cemitério, porque não tem característica de retenção, e a drenagem se daria para o Município de Cabo Frio, podendo inclusive impactar outro ente federativo” e “que o solo seria de alta drenagem” indo “direto para a rede pluvial e deságua no Rio Una e no Bosque da Malhada”.
Álvaro Elídio Gonçalves, na Baía Formosa.
No relato do biólogo consta ainda a informação que “as intervenções no local estão sendo feitas por pessoas despreparadas para o manejo de espécies florísticas”. Ele contou ainda que um pesquisador do Instituto de Pesquisa Jardim Botânico do Rio de Janeiro se deparou com uma espécie florística, recém descoberta, arrancada do solo e deixada no local, e lembrou que a área também está incluída no Plano de Preservação da Mata Atlântica municipal, que faz um corredor ecológico até a APA Pau Brasil.
Com base nesse relatório, o MPRJ entendeu necessária a suspensão das intervenções no local e aprofundamento dos estudos sobre a fauna e flora local, e, também entendeu necessário a prévia realização de estudo de impacto de vizinhança.
Em reunião realizada na quinta-feira (15), o Promotor de Justiça titular da 1ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva do Núcleo Cabo Frio, Dr. Vinicius Lameira Bernardo, se reuniu com representantes de entidades ambientais da cidade. O MPRJ oficiou instituições de pesquisa para levantamento florístico para realizar uma vistoria no local e um estudo técnico do solo e recomendou a suspensão das intervenções. Ficou acertado com secretário de Meio Ambiente, Pesca e Urbanismo, Evanildo Nascimento, que o município não irá se movimentar sobre a construção do cemitério enquanto não houver resposta das instituições e um diálogo aberto com a comunidade e com o MPRJ.
Estiveram na reunião a diretora da Associação de Moradores e Caseiros da Ferradura e conselheira do Conselho de Meio Ambiente do Município de Armação dos Búzios, Mônica Casarin Fernandes Elsen; a conselheira da APA Pau Brasil, conselheira do PECS e representante ONG CECNA, Anna Roberta Mehdi;o presidente da Comissão de Direito Ambiental da OAB Núcleo Búzios e conselheira da APA Pau Brasil, Carolina Mazieri; Ana Paula da Silva da IFRJ; a bióloga MSc. em Ciência Ambiental UFF, Mabel Ludka; a conselheira do Meio Ambiente de Búzios, Denise Morand; e o diretor Geral do Campus IFF, Victor Barbosa Saraiva.
Deficiência do cemitério ativo
A construção de um cemitério municipal é uma das promessas de campanha do prefeito Alexandre Martins, que inclusive visitou a área em maio. O único cemitério da cidade é o situado atrás da histórica Igreja de Sant’Anna, na Praia dos Ossos, terras da igreja, doadas por Manoel Joaquim da Silveira para Sant’Anna. O local não tem mais estrutura para atender à população.
Uma obra de ampliação foi iniciada no início do ano passado e chegou a ser embargada pela justiça Instituto dos Arquitetos do Brasil e o Fórum das Entidades Civis de Armação dos Búzios, entraram com representação no Ministério Público Estadual, questionando a intervenção em sítio considerado patrimônio histórico da cidade. A obra de construção de 54 gavetas foi autorizada em junho, quando o município trouxe a situação de calamidade que assola a região devido ao avanço da pandemia de Covid-19.