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O que Você faria se na condição de professor, um aluno, não concordando com a nota que recebeu, decidisse resolver a desavença com uma granada  (sim, uma granada) nas mãos? Se o leitor pensa que isto aconteceu em alguma escola americana, saiba que isto é uma história real, vivida por este que escreve estas mal traçadas, na distante década de 90, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Esta é apenas uma das histórias que povoam o cotidiano de milhares de professores em todo o Brasil, e com certeza existem muitas, cujo final é bem mais trágico.

Nesta semana, o Supremo Tribunal Federal, a mais alta instância jurídica deste país, decidiu que é proibido aos pais tomarem para si, a responsabilidade de educarem seus filhos. A sentença foi proferida depois de uma série de apelações no sentido de impedir que os pais retirem seus filhos da educação regular. O principal argumento é que muitos destes pais assim procedem, porque são movidos por valores religiosos, e acabam retirando seus filhos de ambientes cujos valores estejam em conflito com sua formação moral e religiosa. Os ministros do STF também argumentaram que no Brasil, inexistem mecanismos confiáveis que possam aferir se a educação dada pelos pais esteja em concordância com os parâmetros curriculares. A decisão, bem como os votos dos ministros, são documentos que merecem ser analisados, porque são um material extremamente interessante. Eles refletem a discussão sobre os limites de ingerência do Estado, seja na esfera pública, ou na vida privada.

Este tipo de discussão já foi objeto em outra Corte Suprema, neste caso a norte-americana. Lá, o “homeschooling”, ou a educação dada pelos pais é regulamentada pelos estados da federação. Atualmente, mais de 2 milhões de crianças e adolescentes norte-americanos recebem educação por este sistema. Em diversos estados americanos, existem procedimentos de avaliação destes estudantes. Vários estudos mostram que o desempenho de alunos que aprendem pelo sistema de ‘homeschooling” é superior ao de alunos que frequentam escolas regulares.

Nos Estados Unidos, muitos pais decidiram retirar seus filhos de escolas regulares por conta da formação religiosa, mas nem sempre este foi o caso. Várias famílias perceberam que seus filhos pouco aprendiam em uma escola normal, principalmente quando estas escolas eram localizadas em áreas com altos índices de violência.

Pode-se argumentar de maneira bastante razoável, que a “Escola” não se resume apenas ao lugar onde se aprende Matemática, ou História,  que ela, a Escola, é antes de tudo, um “espaço de socialização”. Este argumento é verdadeiro, mas isso não é tudo. Casos de violência, como o que  narrei mais acima,  não são uma realidade apenas de professores, muito pelo contrário, eles estão cada dia mais presentes também no cotidiano dos alunos. A violência vai desde o “bullying” verbal, até a agressão física, chegando mesmo em alguns casos, a desfechos trágicos.

Portanto, o argumento de que a “Escola é um espaço de socialização”, deve ser visto com muitas reservas. Em muitas regiões mais pobres, territórios marcados pela vulnerabilidade, a Escola é vista pela comunidade como um equipamento público, com o qual a comunidade pode contar para uma série de coisas. Nas escolas, mães e pais podem conseguir algum tipo de apoio para terem acesso a  serviços públicos, sobretudo os de Saúde; as famílias podem também contar com a escola como uma parceira para ajudar a cuidar dos seus filhos, quando os pais estão na jornada de trabalho. Todas estas coisas, e muitas outras mais presenciei em escolas públicas do Rio de Janeiro, e também na Região dos Lagos.

Ou seja, para a maioria dos pais que vivem nestas áreas, a escola é tida como uma prestadora de políticas assistenciais, se seus filhos estão ou não aprendendo algum “conteúdo”, isso fica em segundo plano. Deixo bem claro que este uso, digamos ‘instrumental” da escola, não decorre de um suposto desprezo desta mesma população para com a educação formal, muito pelo contrário. Pais e mães têm alto apreço por aquilo que é ensinado pelos professores mas, em muitos casos, eles sequer têm meios de acompanhar a trajetória de seus filhos. Não é incomum que em muitas famílias, os filhos estejam recebendo uma educação formal maior do que aquela que seus pais receberam, quando eram jovens. Portanto, mais uma vez, a coisa não é tão simples quanto se pensa.

Mas, quando este mesmo espaço deixa de prover estes serviços, a opinião desta população para com a escola, muda rapidamente. Em várias comunidades do Rio de janeiro, até recentemente a escola era tida como uma “zona neutra”, no cenário de violência crônica que assola estas comunidades. Tanto policiais, quanto traficantes na medida do possível, entendiam que a escola era um espaço físico e social que não entrava nos seus confrontos. No entanto, as mortes de várias crianças e adolescentes dentro mesmo de escolas, assim como as constantes cenas de tiroteios em áreas próximas às escolas, está mudando essa percepção. A escola já não é mais este ‘espaço sagrado”, quase um oásis na paisagem de violência destas comunidades.

Ao mesmo tempo, em várias cidades do Estado Rio de janeiro, a situação falimentar da máquina pública desencadeou um movimento de inúmeras greves e paralisações, e  aqui na Região dos Lagos, a situação não foi diferente.

Para coroar este quadro, os resultados recentes divulgados pelo IDEB são apenas o último prego a fechar a tampa deste caixão. Em outra ocasião, posso até me dedicar a analisar mais detidamente os números deste índice, mas por ora, fiquemos apenas com algumas conclusões. De uma maneira geral, ao menos na Região dos Lagos, uma criança que ingressa na rede pública de ensino no 5º ano do Ensino Fundamental, consegue um desempenho melhor do que outra, que está no 9º ano. Em suma, estas crianças saem piores do que entraram na rede de ensino.

Sim, existe uma penca de argumentos que contestam estes resultados, que eles são parciais, que estes resultados são maquiados, e assim por diante. No entanto, levando-se em conta todas estas falhas, o índice mostra pelo menos alguma coisa. Mostra por exemplo, que a Escola, de uma maneira geral já não mais consegue proporcionar aos alunos a transmissão de conhecimento formal de maneira eficiente. Falando muito francamente, é cada vez mais difícil aprender Matemática ou História em uma escola. Para isso, contribuem toda uma pletora de fatores, destes que já conhecemos de muitos, e muitos carnavais. Sobra então, o “espaço de socialização”. Bem, se a violência e a instabilidade invadem até mesmo este “espaço de socialização”, conclui-se que sobra pouco, ou quase nada da escola.

Estamos a poucos dias de uma eleição presidencial, uma das mais importantes de nossa recente retomada democrática. Como se sabe, tirando os lugares comuns das promessas de campanha, Educação não dá voto. Por isso, a decisão do Supremo Tribunal Federal foi eclipsada pela atenção que a mídia dedica à campanha política.

Mas esta decisão a meu ver, terá consequências que vão colocar mais uma vez, a questão da Educação nas discussões. O núcleo deste debate é um só: para quê serve uma escola no Brasil ?


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Noticiário das Caravelas

Coluna da Angela

Angela é uma jornalista prestigiada, com passagem por vários veículos de comunicação da região, entre eles a marca da imprensa buziana, o eterno e irreverente jornal “Peru Molhado”.

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