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Ou o dia que me tornei um sábio bêbado.

Lá nos primeiros dias do século 21, eu  estava bem metido a filosofar, não só eu mais um grupo de garotos e garotas que viviam seus dias tediosos e noites idem das cidadezinhas da Região dos Lagos do Rio de Janeiro. O festival do Crustáceo em Barra de São João – um dos menores pedaços de chão do litoral fluminense (na verdade pertence ao município de Casimiro de Abreu) sempre foi uma festa que trouxe muitos jovens assim, vindos da Serra e de lugares mais alternativos do Rio em uma migração curiosa, fruto de um boca a boca sobre uma certa “energia” do lugar.

barra

Pra começar a história, lembro-me de estar em frente ao bar do Peter – uma lenda viva de Barra de São João-  experimentando Steinhaeger com cerveja, para ver se realmente fazia pirar, como dizia a letra da música da banda de rock mineiro Tia Anastácia.  Fez.

Daí pra frente minhas lembranças daquela noite são quadro a quadro.  Um encontro com uma ex-namorada na esquina  do bar. Eu cumprimentando vários amigos. Bebendo mais um pouco e depois pulando junto com um  monte de gente no show do Geraldo Azevedo –  festa mais bicho grilo impossível, e cantando: “Apenas apanhei na beira mar um taxi pra estação lunar!”, que trocamos o final do refrão pra “Apenas apanhei na beira mar um baseado pra eu fumar.”.

Lá pro fim da festa, alta madrugada, encontrei meu primo, o músico Alex Pedreira, em uma barraca de lona, sentado com um monte de gente tomando cerveja. Desabava uma chuva do cacete.  Sentei apenas na intenção de filar uma cerveja – olha, eu tava sem um tostão no bolso- e o papo tava animado. E foi chegando o amigo do amigo do amigo de alguém, e  logo estava uma galera enorme  que quase não se conhecia direito, divertido.  Eu estava até então tranquilo, mirando uma loirinha que eu tinha certeza que não ia dar em nada. Mas me agradava mirar. Foi quando Alex me jogou no fogo:

“Victor fala ai pra galera daquela parada que você me falou não sei quando se ele não sabia, imagina eusobre transcendência de ver uma arvore e enxergar tamancos!” .  O que? Pensei: “que porra é essa?”. Eu poderia ter rido e tudo teria acabado ali, mas minha vaidade era maior e vi que todos se viraram pra me ver explicar aquela loucura.

Engoli a cerveja quente do meu copo e falei. O que eu falei? Não faço ideia, mas  um hippie velho disse emocionado: “Eu entendi!”.  Mas quando eu pensei que tinha acabado aí a namorada desse hippie disse: ‘não entendi. Repete?’.  Puts! Eu nem fazia ideia do que tinha dito e então disse outra coisa totalmente diferente. Todos adoraram! Foi uma catarse, fui ovacionado. Oh! Na hora só pensei que tinha conseguido chances com a loirinha. Mas… sempre tem um mas, e um  Zé Ruela que estudava engenharia em uma faculdade de filho de papai, mas tinha uma namorada maneira, me disse pra  repetir. E assim, um bando de gente que na verdade não tinha entendido – até porque não havia nada pra entender (eu acho),  me pediram pra repetir.

Eu pela terceira vez disse qualquer coisa com a convicção de um mestre. Com a mente embotada de álcool  disse outra coisa totalmente diferente das duas anteriores. Pensei: agora é o meu fim, vão me desmascarar. Mas não! Todos ficaram eufóricos novamente, eu fui cumprimentado pelas pessoas do outro lado das três mesas que juntamos pra caber todo mundo.

A namorada do hippie, que também devia ser hippie, me disse assim: “Achei seu pensamento muito antiecológico! Caralho! Ela se ligou na questão  de transformar arvore em tamanco no processo de cortar a arvore para fabricar os chinelos de madeira!  Que viagem, pensei. Mas como eu não fazia ideia do que eu estava dizendo, retruquei a ela que não aguentava mais o pensamento politicamente correto, “era muito careta”, eu disse. Ela mexeu a cabeça concordando comigo em me disse que se sentia velha. O que? É isso mesmo, eu já tinha virado um venerável a quem as pessoas pedem conselhos! Ela me falou que era professora e que seus alunos a chamavam de senhora. Disse; deve ser porquê você é a professora deles, né. Ela ficou feliz a beça com minha resposta.

Preciso dizer que eu com isso ganhei condições com a menina loira. O dono da barraca pediu licença porque já era tarde e ninguém estava comprando mais nada.  Fomos todos embora. Todos me davam tchau como se eu fosse à reencarnação de algum monge tibetano.

Fui então pela rua, eu o Alex, a loirinha e sua amiga. Caminhamos até o Praião de Barra de São João (dá um Google). Me deitei ali na areia com a loirinha, que nunca mais vi, e o sol nasceu atrás das nuvens de uma manhã nublada. Dormi todo aquele dia. Era Domingo, e eu tinha toda a vida pela frente.

Por Victor Viana

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Angela é uma jornalista prestigiada, com passagem por vários veículos de comunicação da região, entre eles a marca da imprensa buziana, o eterno e irreverente jornal “Peru Molhado”.

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