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Crédito da Foto – Davi Ribeiro
 Por Luisa Barbosa e Martha Pessoa*

 

A frase de José Saramago, que intitula esse texto, é produto do contexto social e da visão de mundo desse escritor, ainda o único nobel de literatura da nossa linda língua portuguesa. Para Saramago, militante da liberdade e dos direitos sociais, obscena mesmo era a fome, que matava e mata milhões no mundo. 

 
Para Hitler, uma das figuras mais perversas de toda a história mundial, obscenas eram as obras de Picasso, Kandinsky e Matisse, pintores renomados, mas considerados por ele como vetores “judaico-bolcheviques”. O ditador em 1937 transformou a mostra “Arte degenerada” num marco da história social e política, sendo referência nos dias de hoje. A exposição mostrava a arte como um espaço do diverso, da alteridade, da ambiguidade, tudo o que o modelo nazi-fascista lutava (e até assassinava aos milhões) para destruir. 
 
Para um tribunal indiano, obsceno era o beijo no rosto entre os atores Richard Gere e Shilpa Shetty num evento da campanha anti-Aids em Nova Délhi. Para internautas, membros de movimentos ultra-conservadores nacionais, obscenas eram as obras de Adriana Varejão, Lygia Clark, e outros artistas contemporâneos na exposição cancelada pelo Banco Santander do “Queermuseu — Cartografias da diferença” em Porto Alegre.  
 
E para Búzios ? O que seria obsceno? 
 
A Câmara Municipal de Armação dos Búzios aprovou recentemente um projeto de lei que coloca em cheque essa questão. O PL proíbe a divulgação e acesso à imagem, música e textos pornográfico ou obscenos pela escola e determina que as suas famílias sejam previamente informadas do material pedagógico adotado na escola. O Projeto faz um chamado importante à sociedade buziana: que os pais participem da vida escolar, atuem junto à escola, junto da vida pedagógica . Num município onde nem o prefeito e nem os vereadores confiam na escola pública para a educação dos seus filhos, é fundamental que os pais atuem pela educação de qualidade na cidade. O Projeto, entretanto, deixa indicações perigosas sobre o que é e o que não é obsceno citando inclusive, em seu artigo 3o, imagens de orgãos genitais como tal.
 
O Artigo 79 do Estatuto da Criança e do Adolescente já prevê proteção aos estudantes quando diz que “publicações destinadas ao público infanto-juvenil (…) deverão respeitar os valores éticos e sociais da pessoa e da família”. Então, para quê uma legislação específica para a cidade? 
 
Há no Brasil um movimento organizado de avanço do obscurantismo e do discurso da intolerância. Desde 2004 uma ONG intitulada ”Escola sem partido” usa de atos não verídicos para estimular o ódio e fomentar leis em todo país com tais características conservadoras. O caso de Alagoas é ilustrativo neste sentido. No Estado um material falso intencionalmente divulgado como sendo de autoria do MEC, continha imagens sugestivas e de estímulo a práticas sexuais. O MEC não reconhece o material e o Ministério Público investiga o caso. O estrago, contudo, já foi feito. Diversos vídeos na internet divulgam o material como se ele fosse verdadeiro. O mesmo ocorre com a cidade de Contagem onde uma possível prova de uma professora conteria uma questão polêmica relativa à prática sexual. A Justiça também investigou o caso e constatou que na verdade as perguntas sobre sexo tinham sido realizadas pelas próprias crianças. No entanto, mais uma vez, o boato suscitado pelas redes sociais já havia se tornado “verdade”, uma pós-verdade como defendem pesquisadores sobre o tema. A professora, por outro lado, dilacerada, vítima de um tribunal cibernético popular.
 
O fato é que a mentira com rosto de verdade inspirou e inspira diversas legislações. Na mesma Alagoas, personagem do boato mais famoso, o termo “gênero” foi retirado do Plano Estadual de Educação e um conservador Projeto de Lei chamado “escola livre” foi aprovado. O caso de Contagem circula na internet e inspira vereadores de municípios pequenos do Brasil, como em Búzios.  Em 2015 materializou-se também o PL 867 de autoria Izalci Lucas Ferreira do PSDB-DF, membro da bancada evangélica, e outros Projetos de mesmo teor ideológico chamados de “Escola sem Partido”, mais um bom termo da pós-verdade… afinal, quem é a favor de uma escola com partido? Pela dubiedade que o nome “escola sem partido”  traz diversos movimentos ligados à educação preferem intitula-lo como Lei da Mordaça.
 
O PL é comparado por juristas aos atos institucionais do período da ditadura, que também tentavam limitar a liberdade de expressão. Por isso, o Ministério Público Federal e a Advocacia Geral da União já entraram com ações pela inconstitucionalidade destes Projetos de Leis, que ferem o artigo 206 da Constituição Federal, sobre liberdade de expressão. 
 
O debate é profundo mas o fato principal é que a escola não pode se fechar da realidade. Ao contrário, deve dialogar com a sociedade que a cerca e formar jovens com possibilidade de olharem para o mundo e torná-lo um lugar melhor para viver. Não se pode impor neutralidade a uma realidade que não é neutra. Deve-se tratar da vida na escola e os pais precisam participar efetivamente da vida escolar dos filhos, principalmente na escola pública, que é do público, é laica, e não deve ter compromisso com valores religiosos e ideológicos. Por outro lado o educador precisa ser tratado com respeito. Professora não é tia. Professor não é escravo. E educar é tarefa de todos: do vizinho, do professor, do político, do médico… Todos nós nos educamos e educamos os outros diariamente. Somos educados quando vemos uma pessoa fazendo caridade, quando emprestamos um livro, defendemos o Mangue de Pedra, as Dunas do Peró, ou a nossa simples opinião, com coragem e altivez, sem medo de repreensões ou perseguições disciplinares ou salariais. Somos educados e educadores sempre. Eduquemos. Eduquemo-nos. 
 
*Martha é Pedagoga, professora fundamental 1 na Escola Municipal Profª Eliete Mureb de Araújo Góes. Luisa  é doutora em sociologia, professora de sociologia e filosofia no CM Paulo Freire e no CE João de Oliveira Botas 

Noticiário das Caravelas

Coluna da Angela

Angela é uma jornalista prestigiada, com passagem por vários veículos de comunicação da região, entre eles a marca da imprensa buziana, o eterno e irreverente jornal “Peru Molhado”.

Coluna Clinton Davison

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