“Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm a forma do nosso corpo e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: E, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado para sempre à margem de nós mesmos.” – Fernando Pessoa
Por José Carlos Alcântara
Apesar da vida difícil dos seus moradores, no 3º Distrito de Cabo Frio havia muita paz. Era um lugar pequeno com ruas de terra, com um sossego que encantava e aquecia o coração de todos. Os visitantes daquela pequena aldeia de Búzios sentiam uma doce sensação de liberdade quando caminhavam pela Rua das Pedras.
Havia poucos turistas pisando em seu chão, tão distraídos que sequer se davam conta de que desfrutavam dos últimos momentos tranquilos de um lugar que agora é apenas uma vaga lembrança na memória. Um sonho que acabou pela ganância e descaso dos que transformaram a própria razão de ser de Búzios, num negócio predatório e vulgar.
A beleza daquele belo lugarejo, que ficou agora no passado, era tão rica que até hoje as fotografias desbotadas que restaram nos emocionam. Elas gritam por socorro, como se estivessem pedindo para impedirmos a sua destruição total e chamam a nossa atenção para o fato de que o pouco que havia então, era o suficiente para ser feliz.
O progresso que veio depois parece que serviu também para nos trazer muitas tristezas, preocupações e intranquilidade. Quem ainda se lembra com carinho daquela Búzios que não volta mais, é forçado agora a conviver com tantas incertezas, que poderá ter que enterrar para sempre as imagens daquele sonho bom que se foi.
Cultura é todo aquele complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros hábitos e capacidades adquiridas pelos homens como membros de uma sociedade, mesmo que ela seja apenas uma aldeia de pescadores.
Graças a todos os moradores e os frequentadores de Búzios, há um caldo cultural único aqui, onde misturou-se certa sofisticação à simplicidade de se conseguir conviver com a belíssima natureza que nos rodeia e nos faz amarmos tanto nossa cidade.
Uma boa história para nos lembrarmos com saudade daqueles tempos é a do encontro do pescador com um poeta que caminhava pela Rua das Pedras e, estando muito aflito para vender a sua casa, pergunta-lhe:
– Eu preciso vender com urgência aquela minha casa que o senhor conhece tão bem. Será que o senhor poderia escrever um anúncio para publicar no jornal?
O poeta pegou um papel e escreveu: “Vende-se uma bela propriedade, onde cantam os pássaros ao amanhecer no extenso arvoredo, cortada por águas cristalinas e marejantes. A casa é banhada pelo sol nascente e oferece a sombra tranquila das tardes na varanda”.
Alguns meses depois, o poeta encontra o mesmo pescador e pergunta-lhe se finalmente havia conseguido vender a sua casa em Búzios e, para sua surpresa, ele responde:
– Eu nem penso mais nisso – Quando li o anúncio que o senhor escreveu, eu percebi a maravilha que eu tinha!
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