Audiência pública discutiu políticas públicas e segurança para que casos de feminicídios e violência doméstica não voltem a assolar o balneário
“Não queremos perder mais mulheres” foi uma das frases de mais destaque e dita por diferentes pessoas durante a audiência pública realizada na Câmara Municipal de Búzios, na noite de sexta-feira (20). Ela demonstra a preocupação e o motivo pelo qual as lideranças sociais que lutam pelo fim da violência doméstica no balneário solicitaram o evento.
Na presença de representes do governo municipal e do legislativo, além de entidades como Ministério Público Estadual, polícias Civil, Militar e Federal, Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), Tribunal de Justiça (TJRJ) e Comissão da OAB-Mulher (Búzios), os grupos levantaram os medos, os anseios e pediram por ruas iluminadas, projetos eficazes, garantia de proteção às vítimas e celeridade nas investigações dos casos de feminicídios.
À frente do Movimento de Mulheres Olga Benário, Movimento de Mulheres da Região dos Lagos e da Frente Feminista de Búzios, Pétala Cormann falou sobre o descaso com as mulheres que chegam à delegacia da cidade para registrar uma ocorrência e que muitas vezes são desacreditadas. Ela destacou que, além de criar políticas públicas, que haja comprometimento e fiscalização para garantir que o trabalho seja realmente executado.
“A discussão não é somente como nós vamos inibir que aconteçam casos, mas como nós vamos criar políticas de prevenção para que nenhuma outra mulher volte a morrer no município de Búzios. A gente precisa de uma cidade que caminhe para construir políticas públicas que tratem o problema verdadeiramente pela raiz e que alcancem, principalmente, as mulheres que moram nos bairros periféricos”, destacou.
A delegada da Polícia Federal, Paula Mary, falou que, embora haja diversos direitos assegurados, em muitos casos a implementação e execução são falhas. “Infelizmente apesar de sermos 52 % da população, a gente ainda está muito sub-representada em diversas instituições e órgãos. Muitas das vezes somos silenciosas não porque a gente não consegue falar, mas porque somos silenciadas. Então, é muito positiva todas as medidas alcançadas, mas a gente tem conquistado da pior forma possível e que não tem sido suficiente para que assegure a vida”, destacou a delegada.
Ações municipais
O prefeito Alexandre Martins esteve no evento e ressaltou as ações realizadas no município desde quando assumiu a prefeitura. “Temos muito orgulho de ter criado a Secretaria Municipal da Mulher, que antes não existia, além da Patrulha Maria da Penha, da Guarda Civil Municipal, que trabalha 24 horas por dia de forma incansável ajudando as mulheres. Recentemente, criamos a Sala Lilás, dentro do Hospital Rodolpho Perissé, para dar atendimento humanizado às mulheres vítimas de agressão que procuram a unidade. Também temos a intenção de criar um abrigo para mulheres”, contou o chefe do executivo.
O tenente Victor Santos Madureira, responsável pela 5ª Cia do 25º Batalhão da Polícia Militar (BPM) destacou a diferença da Patrulha Maria da Penha da PM e do município.
“A Patrulha Maria da Penha da Polícia Militar faz o pós das medidas protetivas e o acompanhamento daquelas mulheres vítimas. A da Guarda atua nas situações emergenciais, e isso é uma exclusividade na região e foi pioneiro no município de Armação dos Búzios. Nos auxilia e nos complementa. Na maioria das vezes a gente envia nossa viatura para que auxilie e garanta a integridade física do agente da Guarda Municipal”, explicou.
A Patrulha Maria da Penha da Guarda Municipal atende pelo número de (22) 9.9103-9695 (WhatsApp).
Falta de Iluminação
A diretora da Associação de Moradores e Caseiros da Ferradura (Amoca), Cristina Pimentel, destacou algumas medidas de prevenção. Segundo ela, é preciso promover projetos de educação no município para combater o machismo e o patriarcalismo, por exemplo, além de usar as praças públicas para fomento da cultura. Mas frisou que existem ações simples que precisam ser solucionadas de forma urgente, como iluminação das ruas.
Ela explicou que como Búzios é uma cidade noturna, muitos dos postos de trabalho funcionam após a meia noite e, a escuridão das ruas e dos pontos de ônibus deixam as pessoas, principalmente, mulheres vulneráveis. Outra crítica foram as luzes de led, que apesar de trazer economicidade quando estão em pouca quantidade não clareiam tanto.
O prefeito disse que está finalizando a fase de licitação para resolver o problema da iluminação. Serão instaladas redes baixas para iluminar os pontos que não tem postes, mas que a substituição das lâmpadas pelas de led é necessária porque é dinheiro que pode ser aplicado em outra área.
Segurança pública
O secretário de Segurança e Ordem Pública, Sérgio Ferreira dos Santos, destacou a importância do Centro de Monitoramento para a cidade por ajudar na identificação dos autores de delitos. Segundo ele, muitos casos como recuperação de veículo, furtos e roubos são solucionados. Informou que as imagens estão sempre à disposição das polícias Civil e Militar e que, por sigilo das investigações dos casos, nem sempre podem ser expostas de forma pública para não atrapalhar o trabalho da polícia.
O secretário foi questionado pela ativista Mônica Casarin sobre a aplicação do valor de mais de R$ 7 milhões que constam na dotação orçamentária da pasta de Segurança Pública para este ano. Entre as perguntas estavam valor pago ao efetivo da PM bancado pelo estado e pelo Programa Estadual de Integração na Segurança (Proeis); quantidade de policiais trabalhando no mesmo turno; se o Proeis trabalha com viaturas municipais ou estaduais; quais as ações de segurança pública serão implantadas conforme previstas no orçamento; quantas câmeras de segurança serão implantadas este ano com a verba prevista; e, por fim, se o município pretende acrescentar créditos adicionais a esse orçamento para 2022.
Quem respondeu sobre a verba foi o prefeito Alexandre Martins que disse que o gasto hoje com o Proeis é de R$86 mil, garantiu que, se precisar, o orçamento será complementado. Sobre o monitoramento, ele explicou que as 300 câmeras que o município possui não são só para as ruas, mas para os prédios públicos também, e que a previsão é que os equipamentos tenham reconhecimento facial para facilitar a identificação de quem entra na cidade. Quanto aos projetos, será inaugurada a sede da Guarda Civil este ano e também está previsto um Canil da Guarda para auxiliar no trabalho de patrulhamento.
Sobre o efetivo atuante na cidade de Búzios, o tenente Madureira respondeu. Explicou que o efetivo da 5ª Cia é de 61 policiais pagos pelo estados, com 16 policiais atuando diariamente. Além desses agentes, a cooperativa conta com mais 10 do Proeis pagos pelo município, logo um total de 26 policiais por dia na cidade. Em relação ao número de viaturas, são 9 da PM e 3 do município, totalizando 12 carros à disposição dos militares todos os dias.
Investigações dos feminicídios e novas ações da polícia
Representando o delegado Sérgio Santana, o policial Gustavo explicou que a delegacia está com novos policiais, que chegaram há cerca de 35 dias, e que estão muito empenhados em investigar os casos de feminicídios no município.
“É importante pra a gente, logo no início da nova administração e ainda conhecendo a cidade, participar desse momento importante. A gente gosta de ouvir o que a sociedade passa pra gente. Estamos muito comprometidos dando foco às investigações, não posso adiantar por questões de sigilo, mas estamos empenhados. Reativamos há duas semanas o Núcleo de Atendimento à Mulher dentro da delegacia, com servidores específicos para isso. Dentro da nossa limitação de servidores, estamos tentando parceria para criar o Núcleo Integrado de Atendimento à Mulher (NIAM) junto à Prefeitura. A gente ficou muito feliz e satisfeito, porque nessa cidade tem muita gente interessada em correr atrás e ajudar a investigar”, ressaltou o policial contando que está ativo um número de WhatsApp (22) 9.9949-4682 e Instagram para facilitar a comunicação com os moradores da cidade.
Questionado pela demora de expedição dos mandados dos prisão, mesmo que temporários, para os suspeitos dos crimes de feminicídios, como o caso da Pâmela Carvalho e da Evangelina Trotta, cujos suspeitos tinham relação com as vítimas, o juiz 2ª Vara da Comarca de Búzios, Rafael Baddini, explicou. Segundo ele, esse processo de expedição é rápido e em muitas vezes a decisão do juiz sai até antes do mandado físico propriamente dito, mas que isso depende da representação de uma autoridade policial com o pedido do Ministério Público para que possa ser decretado.
“O poder judiciário nesse caso precisa ser provocado e, quando provocado pelo MP, analisa em até 48h e defere ou não. A gente não pode investigar”, explicou o magistrado destacando a decisão de prisão temporária do suspeito de matar a jovem Pâmela Carvalho, na quinta-feira (19).
Renata Chagas, promotora do Ministério Público Estadual, completou explicando que prender uma pessoa é preciso quesitos legais para isso. “Quando um homicídio acontece e não tem uma prisão em flagrante, a gente não pode pedir para prender uma pessoa só porque é o ex-companheiro dela, nenhum juiz vai decretar a prisão porque é preciso requisitos legais para prender uma pessoa. Eu preciso de elementos mínimos de que essa pessoa praticou esse crime e eu preciso ter isso provado no inquérito. Muitas vezes acontece das pessoas falarem, mas não querem colocar no papel”, explicou, detalhando que a prisão temporária significa que as investigações continuam. Ela também deixou um número de telefone para quem desejar contribuir com informações que vão agregar aos processos que tramitam na promotoria – (22) 2633-1095 (WhatsApp).
A audiência pública foi realizada pela Comissão da Defesa da Mulher e a Comissão de Segurança Pública da Câmara Municipal de Búzios à pedido da Frente Feminista de Búzios, Movimento de Mulheres Olga Benário, Movimento de Mulheres da Região dos Lagos e Fórum de Políticas Públicas para as Mulheres de Armação dos Búzios. Na ocasião também foi lida uma carta apontando o descaso como foi tratada a morte da empresária argentina Leonor América Castro de Abálsamo, no dia 19 de março deste ano, e que ainda não foi solucionada.