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Muito antes do Vampiro da Sapucaí

 

Em 1968, quando a Ditadura Militar escancarou de vez, um grupo de suburbanos colocou na passarela do samba a seguinte pergunta: “Meu Deus, está extinta a Escravidão?”

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Uma das poucas imagens do desfile histórico da Unidos de Lucas em 1968

Era um feriado quente de 15 de novembro, naquele ano de 1932. Havia muitos motivos para comemorar este dia. A República, que não tinha ainda 50 anos, passara por seu teste de fogo. A Revolta Federalista de São Paulo terminou com a vitória de Getúlio Vargas contra as forças daquele estado, o mais rico e bem armado da federação.

Para todos os efeitos, as dúvidas que pairavam sobre a liderança do gaúcho Vargas, desde o golpe de 1930, foram completamente dissipadas. Os paulistas estiveram muito próximos de chegarem à capital federal, o Rio de Janeiro. Nossa história talvez tivesse sido outra, muito diferente, se as forças de São Paulo tivessem derrubado Getúlio Vargas.

Estas notícias ainda estavam frescas nos jornais e no rádio, quando um grupo de trabalhadores reuniu-se no distante bairro carioca de Parada de Lucas. Cortado hoje pela Avenida Brasil, Parada de Lucas só é lembrada  por conta das constantes notícias de confrontos entre facções criminosas. Mas naquela época, Parada de Lucas era um dos paradeiros dos muitos trabalhadores que buscaram no subúrbio, terra barata o suficiente para que ali pudessem construir uma casa.

Como muitas áreas da Leopoldina, Parada de Lucas era um mar de antigas pastagens, mato alto pontilhado por uma casinha aqui, e outra ali. No meio, a ferrovia cortava o território, era o ponto de ligação entre o lugar e a “cidade”, lá distante, onde hoje é o Centro do Rio de Janeiro. Naquele feriado da República, aquele grupo de trabalhadores reuniu-se para formar uma pequena escola de samba, a Aprendizes de Lucas.

Não é este o lugar para inventariar uma história das escolas de samba do Rio de Janeiro, mas pelo menos vale destacar que entenderíamos muito da formação da classe operária carioca, estudando mais sobre as maneiras como elas se organizavam, para além das entidades puramente sindicais ou partidárias.

Na década de 60, a “Aprendizes”, deu lugar à “Unidos de Lucas”, resultado de uma fusão com a “Unidos da Capela”, também do mesmo bairro de Parada de Lucas. Em 1968, a escola de samba desfilou na Presidente Vargas, a antiga passarela do samba, muito antes da construção do Sambódromo levando para a avenida um samba-enredo que lembrava os 80 anos da Abolição da Escravidão no Brasil.

“Sublime Pergaminho”, uma composição de  Carlinhos Madrugada, Zeca Melodia e Nílton Russo teve como carnavalesco Clóvis Bornay, uma das figuras mais emblemáticas do carnaval carioca de todos os tempos. Ainda hoje, “Sublime Pergaminho” figura na lista dos melhores sambas enredos, sendo interpretado por Martinho da Vila, Neguinho da Beija Flor, entre outros.

O samba é uma aula de história sobre a escravidão, a Lei do Ventre Livre , a campanha abolicionista e as persistências do racismo e da discriminação racial no Brasil. A única diferença é que ele foi cantado por milhares de pessoas na avenida, em uma das épocas mais conturbadas da história política brasileira.

Como escreveu Elio Gaspari, em 1968, a Ditadura Militar deixou de ser “envergonhada”, para ser “escancarada”. A edição do AI-5, o início das prisões e torturas sistemáticas e também o aparecimento dos grupos de luta armada eram sinais claros de que os militares não sairiam tão cedo do poder.

Pois foi neste estranho e perigoso ano de 1968, um grupo de suburbanos, que encarou ônibus e trens para estar na Presidente Vargas mostrou na avenida do samba da época, a “sua” versão da história do Brasil.

Passados mais de 50 anos, um crítico pode ler a letra de “Sublime Pergaminho” e concluir que a composição era mais uma das peças que rendia homenagem ao “ato magnânimo da Princesa Isabel”. Para estes críticos, a “liberdade” dos escravos deveu-se muito menos à Princesa, do que a resistência dos escravos. Isso é verdade, mas não é toda a verdade.

O fim da escravidão no Brasil foi um processo bem complexo, do qual participaram os abolicionistas, os escravos e mesmo políticos e membros da Família Imperial. A maneira como a Princesa Isabel é descrita na letra mostrava que no fundo, ela era simpática à causa abolicionista, o que era verdade.

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Parada de Lucas ainda rural na década de 30, subúrbio entrando na década de 50, e nos dias de hoje

Isabel não fazia a menor questão de esconder sua opinião de que a escravidão era uma instituição caduca, que deveria ser extinta o quanto antes, opinião que diga-se de passagem era compartilhada por seu pai, o Imperador. Mas uma coisa era ser contra escravidão, outra bem diferente, era ter o poder de acabar com ela.

Este samba enredo desfilou na avenida, em uma época em que os rostos de pessoas eram estampados em cartazes com os dizeres “Terrorista”. No contexto em que foi lançado, e pela recepção calorosa do público ao samba-enredo, “Sublime Pergaminho” pode ser considerado perfeitamente como uma “canção de protesto”, no mesmo estilo das composições de Chico Buarque ou Geraldo Vandré.

Em uma impressionante semelhança com os dias de hoje, o samba da Unidos de Lucas foi visto como uma crítica social às mazelas da escravidão e da discriminação racial. Na época, alguns intelectuais julgavam que este tipo de música não suficiente “engajada”. Na verdade, uma boa parte destes intelectuais não viam com bons olhos as manifestações de muitos sambistas. Para eles, a população negra em sua grande maioria, era uma grande consumidora dos “modismos estrangeiros” e por isso, julgavam eles, esta população não tinha a consciência política suficiente para avaliar criticamente a condição do negro no Brasil. O “Preto de Alma Branca” era a marca do ‘preto alienado”, assim pensavam muitos destes intelectuais.

E então, mais uma vez, 50 anos depois que a Unidos de Lucas marcou seu nome na história do samba com o desfile de “Sublime Pergaminho”, uma outra escola de samba, a Paraíso do Tuiuti colocou na avenida, um samba- enredo que fazia uma clara referência à letra de 1968, que perguntava: “Meu Deus, meu Deus, está extinta a escravidão?”.

2018, como 1968, é uma data importante para a História do Brasil. Já se passam 130, desde que o “Sublime Pergaminho” fora assinado. Por míseros um décimo de ponto, a Tuiuti não levou o título de campeã do Carnaval do Rio de Janeiro, ficando em segundo lugar.  Tal como a Unidos de Lucas, o samba- enredo entra para a história, mas não levou o título. Em 1968, “Sublime Pergaminho” foi classificado em 5º lugar.

Mais uma vez, o momento político colocou um desfile de escola de samba nas rodas de conversa de todo o país. A Tuiuti levou para a avenida uma ácida crítica ao governo Temer e seu rosário de reformas, culminando com uma fantasia do próprio encarnando um vampiro. O desfile viralizou nas redes sociais e não foram poucas vezes que li coisas como “o desfile do povo”, o “samba enredo que lavou alma do povo”, e coisas do gênero.

Aquilo me deixou curioso. Afinal, o tema da escravidão faz parte dos sambas enredo das escolas cariocas há muitas décadas e no entanto, não foram poucas as vezes em que verdadeiras obras primas da música popular brasileira não ganharam a merecida atenção. Então, o que estava acontecendo afinal?

Em um ano de eleição como este de 2018, com os ânimos mais do que exaltados, a polarização eletriza as conversas e divide pessoas, às vezes para sempre. Mas uma coisa me parece certa, o desfile da Tuiuti abriu uma janela para que os grupos políticos comecem a ensaiar uma aproximação com os movimentos sociais, os mesmos  movimentos sociais que foram deixados ao Deus dará depois de 2013, quando milhões de pessoas foram às ruas, e nenhuma mudança política ocorreu em decorrência disso.

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Vampirão da Sapucaí da Paraíso da Tuiuti  foi um referência ao Sr. Michel Temer 

E então, do fundo do passado, um refrão de um samba como “Sublime Pergaminho” serve de mote para que esta conexão entre forças políticas e o “povo” se restabeleça. Não precisa ser muito esperto para deduzir que esta conexão foi refeita de acordo com as conveniências dos grupos que agora precisam legitimar-se frente a este mesmo “povo”.

Em 1968, a Unidos de Lucas não teve a audácia de colocar a Junta Militar, ou o General Costa e Silva como um “vampiro”, mas espero que pelo menos estas mal traçadas sirvam para lembrar que não foi a oposição ao governo Temer que trouxe de volta à avenida do samba a crítica social. Mais, ela já existia em tempos bem mais sombrios e por isso, merece o nosso respeito.

Escute o Sublime Pergaminho 

 

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Serviço: segue o link de “Sublime Pergaminho” de Carlinhos Madrugada, Zeca Melodia e Nílton Russo.

 

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