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Meu tempo de Perú (Semana Marcelo Lartigue)

Um dia comum de fechamento de O Perú Molhado

Por Caroline Moreira (A Carol do Perú)

Eu adorava frases de duplo sentido, com “sacanagem” implícita. Coisas que aprendi trabalhando no jornal

 

 

Carol, em destaque, junto com Camila Raupp, Eva Lartigue, Juliana A’Vila, e Janice Coelho no último dia em que estivemos com Marcelo antes de sua morte (Gravação do Filme do Perú) 2014

Às vezes me pego pensando nele. Às vezes me pego saudosa, até meio triste com tudo que aconteceu com jornal desde sua morte. Muita coisa não digerida, muita coisa que me fez mal, mas que aos poucos tento me livrar.
Foram nada menos do que 13 anos ao lado de Marcelo. Treze anos de muito aprendizado. Ele me ensinou muito. Ele me moldou como diagramador. A parte técnica eu sabia, mas as sutilezas e sacadas do ofício, aprendi com ele.

 

 

Marcelo não era uma pessoa fácil de conviver. Todo mundo sabia disso. Tinha um humor que oscilava conforme sua conta bancária. Não era a toa que vivia mal humorado. Sem dinheiro não tinha jornal, se não tinha jornal, Marcelo surtava.

 

Carol, reinando em seu lugar de destaque na redação do Perú. A única que podia mexer no Mac, até porque era a única que sabia. Na ocasião fechamento de uma edição em um dos muitos períodos de internação do Marcelo em 2014

Nosso início não foi muito amistoso. Marcelo era arrogante, mandão e preguiçoso. Arrastava o fechamento do jornal por diaaaaasss. Ficava uma semana pra fazer um jornal de 16 páginas na época. Tudo bem que o processo era bem arcaico se comparado com hoje: computadores lentos, fotos reveladas e depois escaneadas, zipdrive pra enviar o jornal pra gráfica…

 

 

 

 

Com o tempo, eu e Marcelo fomos entrando em sintonia… ele precisava de mim e eu precisava trabalhar.
Mas como Victor falou no texto anterior, Marcelo sempre pedia mais alguma coisa.

Um dia comum de fechamento de O Perú Molhado. Marcelo com uma camiseta furada na barriga, achamos que ele gostava muito dessa camisa. Quando ele morreu descobrimos que ele  tinha mais de 20 iguais. Inclusive com furo na barriga

Quantas vezes tive que acrescentar 4, 8 até 12 páginas a mais no jornal já pronto porque havia surgido um furo, alguém importante morreu ou simplesmente porque ele tinha dinheiro sobrando. Lembro do stress que Marcelo provocava na equipe já no fim de noite com essas coisas. Me revoltava, batia boca com ele, mas não tinha jeito. Cansei de sair do jornal de madrugada, de acordar no meio da noite com telefonema de Marcelo dizendo que o jornal não havia chegado na gráfica, que estava com problemas, que eu precisava enviar de novo.

Essas situações eram rotineiras. O jornal era precário, tinha computadores velhos, internet e telefone nem sempre funcionavam. Poucos funcionários e muita gente entrando e saindo. A redação era a casa do Marcelo e vice versa.
Então, imagine o caos!

Com o tempo fomos nós apegando… muitas pessoas passavam pelo jornal. Se empolgavam em trabalhar no “Perú”, mas poucas duravam mais que 1 mês.

 

Uma foto onde seguíamos os ensinamentos do mestre Marcelo, pedíamos dinheiro pro jornal sair . Nota do editor: ” Nós unimos pra que o Perú continuasse vivo após a morte do Marcelo. Quase conseguimos, né Carol? “.

Tentei por anos encontrar alguém pra me ajudar e dividir o peso que Marcelo jogava em cima de mim. Ninguém aguentava Marcelo, pior, ninguém entendia ele. Eu entendia, mas também não sei como isso aconteceu.
Uma fato engraçado aconteceu quando eu casei. Viajei por uma semana. Não tinha ninguém pra fechar o jornal. Quando voltei, Marcelo me contou como foi o fechamento sem mim… falou rindo…achando graça do jornal impresso … mas dizendo nas entrelinhas: Carol nunca mais faça isso! Olha a merda que saiu!!!

 

 

Um cara da gráfica e um “diagramador” fecharam o jornal em 3 dias com muita dificuldade, não sabiam tratar as fotos, não sabiam usar o Mac, não sabiam atualizar o site. O jornal saiu sem uma foto nítida! Era um borrão só!
A partir daí ele começou a me valorizar. Fazia de tudo pra me agradar.

Depois que fui morar em Cabo Frio, até táxi ele pagava pra me levar pra casa no fim do expediente.
Marcelo também me deu um sofá da Edno Décor, loja chique de decoração da cidade, que tenho até hoje. Na verdade não foi presente, ele me devia mais de 6 meses de trabalho e me pagou com o sofá.

Outra curiosidade: sempre que voltava de uma viagem, ele trazia uma pelúcia pra mim. Tinha uma coleção de bichinhos inusitados dos mais diversos lugares, desde um camelo que ele trouxe de Israel até uma girafa de Las Vegas. O último foi um panda do Japão, que minha filha brinca chamando de urso.

São tantas histórias… tantas lembranças boas… tantos personagens queridos e complicados que tive o prazer de conviver: Claudio Kuck, Aníbal, Sandro, Nélia, Valdete e tantos outros amigos do Perú.

 

O sanduiche de mortadela, Marcelo com seu celular inseparável, e Carol no seu posto. A barba do Hamber lá atrás

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Nunca pensei que sentiria falta dele, que sentiria falta deles, daquele trabalho cansativo, dos amigos de redação, dos lanchinhos regados a pão de Guilherme, mortadela e coca-cola.
Fico imaginando como seria o fechamento nos dias de hoje…

Eu virei mãe, Victor pai de 3, Isac se foi,  muitos se foram… muita coisa mudou desde sua morte…

Vou guardar no coração esses momentos e ficar na esperança que um dia sua importância e do Perú Molhado para Búzios sejam reconhecidas.

Noticiário das Caravelas

Coluna da Angela

Angela é uma jornalista prestigiada, com passagem por vários veículos de comunicação da região, entre eles a marca da imprensa buziana, o eterno e irreverente jornal “Peru Molhado”.

Coluna Clinton Davison

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