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Há 9 anos um ‘olho no céu’ causou estragos e assustou moradores de Búzios

Sr. Maneli na manhã após o vendaval aponta direção em que estava seu barco quando adernou. Foto/ Bebeto Karolla/ A Raza 2012

Um fenômeno conhecido como ‘explosão de vento’ virou uma embarcação deixando um pescador à deriva, arrancou árvores do solo, fez voar telhados, tijolos e barras de ferro, e fez população acreditar que se tratava de um ciclone

Há 9 anos moradores de Búzios foram pegos de surpresa por um vendaval assustador, anunciado em matéria de capa na edição de abril de 2012 do extinto jornal A Raza (circulou de setembro de 2011 a dezembro de 2012) como: “Ciclone Extra Tropical atinge Búzios causando pânico e estragos”.

Capa da edição nº 9 do Jornal A Raza/2012

O jornal era semanal e buscava atualizar a cidade do fenômeno ocorrido no dia 23 de março daquele ano. Na verdade, o que aconteceu naquele dia em que, de acordo com o subtítulo da matéria, “A população relata momentos de fúria e medo”, foi classificado pelo Clima Tempo como um down burst, que em uma tradução ao pé da letra seria “estouro para baixo”: correntes de vento violentas e descendentes que ao alcançar a superfície se espalham de forma radial, produzindo estragos.

Eu escrevi a matéria em questão e me pergunto porque ter escolhido chamar o evento, no título, de ciclone, não foi por sensacionalismo, nunca foi minha praia. Eu era um iniciante ainda, acho que julguei mais fácil pra chamar atenção da força do acontecido do que utilizar um termo em inglês com o qual a população local não tinha familiaridade. Só que eu não tirei a ideia de ciclone do “nada”. Os que presenciaram toda essa fúria da natureza narraram sempre o que viram e viveram da mesma forma: “Veio um olho de dentro do mar…era um ciclone”, contou na matéria a comerciante Cintia Coutinho . “O vento veio a leste, sudoeste e depois para noroeste, um redemoinho. Senti a casa tremer”, narrou o pescador Dica. O pescador Sr. Manoel, o Manele, na época com 64 anos e com 50 deles labutando como profissional acostumado às intempéries do mar, narrou que nunca tinha visto nada igual. Estava no mar no momento exato em que tudo aconteceu e conta que na sua frente se formou uma grande nuvem escura e aí um vento em forma de redemoinho levantou seu barco “como se fosse palha, e o virou com o fundo para cima”.

Outro morador do centro, Elvis Diogenes, disse: “O vento vinha de todos os lados”. Uma matriarca buziana, Dona Ilma, na época com 75 anos, após relatar um sonho premonitório que teve na noite anterior sobre o vendaval, contou que em 1954 presenciou em Búzios uma forte tempestade de raios que destruiu canoas de pescadores e fez que houvesse um deslizamento de terra no Morro de Sant’Anna, onde fica a igreja e o cemitério com o mesmo nome. Mas acrescentou que nunca viu nada como aquele “olho vindo do mar”. Acredito, não tenho certeza, que o que levou a plasmar na mente dos moradores a ideia de que foi um ciclone, e que foi replicado, de alguma forma, por mim no jornal, foram as narrativas do vento vindo de “todas as direções” e a percepção de um movimento circular que durante o fenômeno, “um olho”.

A imagem de satélite enviada pelo Clima tempo mostrava a massa de vento em direção a Búzios, o que pode ter causado o microburst/ reprodução A Raza/2012

Um down burst é, simplificando, uma explosão que acontece na nuvem e atinge a superfície espalhando o vento em todas direções. Por ter atingido o mar tão próximo da costa levantou a água em movimentos na verdade semelhantes a de um pequeno tornado (redemoinho) que tornaram a experiência ainda mais assustadora. A força do vento neste tipo de fenômeno pode provocar realmente danos comparáveis ao de um tornado com rajadas em alguns casos tão fortes quanto 150 km/h ou mais.

Um pescador que conversei na época, além do próprio Sr. Maneli, me descreveram ventos de cerca de 65 a 80 km. O vendaval não atingiu desta forma toda a cidade. O fenômeno foi apenas em uma área da península, uma extensão de cerca de 4 km, um microburst. Até aqui nos concentramos no fenômeno em si, na força dos ventos, na percepção das pessoas. Mas vamos agora à narrativa dos estragos, que falam de telhados, postes e arvores arrancados e voando. Isso tudo em áreas como bairro Ossos, Armação, Orla Bardot, Rua das Pedras e Praça Santos Dumont.

O resultado após o vendaval deixou um rastro de destruição e prejuízos/ A Raza

“Cadeiras e mesas sendo lançadas ao mar, pedaços de chaminés sendo jogados de um lado para o outro. As arvores sendo arrancadas do solo”, a narrativa se refere ao que o Elvis – já citado aqui, presenciou no bairro Armação, próximos aos quiosques que ficam na Praça dos Pescadores e o Porto Veleiro. A artista plástica Ivone R, que mora e mantém seu atelier de frente para a praia da Armação, relatou que “Foi um horror! Meu telhado voou. Há 30 anos aqui nunca vi nada igual”. Na Rua das Pedras a então, na época, uma recepcionista de uma loja de óculos de sol, descreveu que o teto, que era feito de bamboo caiu. Faltou energia elétrica e ela e mais outros funcionários tentaram fechar a porta do estabelecimento, mas não tinha conseguiram devido a força do vento. “Nesse momento uma barra de ferro voando atingiu a porta da Chilli Beans, que é de blindex. Graças a Deus o vidro não estourou. Mas houve o estouro de um grande pedaço de blindex que veio da direção da praia e ‘sobrevoou’ por cima do telhado de uma casa e caiu na Rua das Pedras, que ficou tomada de estilhaços de vidro. Foi assustador”, contou a atendente.

Apesar de tudo, não houve feridos, felizmente. No entanto, moradores e comerciantes tiveram prejuízos e a Prefeitura, muito trabalho para arrumar tudo.

Eu sobrevivi

Pescador de Búzios conta a incrível história de seu naufrágio

Página do A Raza onde o Sr. Maneli narra sua aventura/ A Raza 2012

Sr. Manoel, conhecido por todos como “Seu Maneli”, de 64 anos, nasceu na Praia de João Fernandes e trabalha na pesca desde os 14 anos de idade. Por 30 anos trabalhou em alto mar nas costa brasileira, 200 milhas fora da Costa. Em 50 anos de profissão passou por muitas tempestades em alto mar, inclusive perdeu companheiros de embarcações sem poder ajudar, mas nada foi como o que aconteceu no dia 24 de março em Armação dos Búzios. Ele mesmo nos conta:

“Como pescador e ser humano nunca passei por um momento tão assustador como no sábado, dia 24 de março de 2012, às 18h (ainda estava claro). Quando saia para pescar camarão para um amigo que me pediu uns para dar à pessoa muito especial.

Coloquei a rede de arrastão, ás 18h15. As 18h30 formaram-se umas nuvens escuras à noroeste, na direção da Ilha Rasa. E com minha experiência em alto mar vi que não era normal. Diminui a velocidade do motor, desliguei a hélice e comecei a puxar a rede colocando rapidamente para dentro do barco. Naquele momento começou a cair uns pingos de chuva. Mas com pouco vento.

Coloquei o barco em movimento, pois o vento ficava mais forte. Já barco de proa, isto é, de frente para onde vinha o vento, acelerei. O vento já estava muito forte.

De repente surgiu há uns 10 metros em frente ao barco uma nuvem muito escura como se fosse fumaça. Um redemoinho levantou meu barco como se fosse palha e o virou com o fundo para cima. Fui pego de surpresa, me segurei na casaria. Não me apavorei. Fiquei de baixo d’água. Tive que prender o fôlego e tirei rapidamente as botas.

Senti que estava me faltando folego na hora de tirar o macacão, então pisei fundo no teto da casaria, que estava de cabeça para baixo, e joguei o corpo para o lado para que quando conseguisse subir não batesse a cabeça. Chegando a superfície respirei fundo, tirei o macacão e amarrei na hélice. Comecei a ficar preocupado em ficar sentado no fundo do barco e não aparecer ninguém para me socorrer.

Pensei em nadar para a balsa que estava a uns 15 metros diante de mim. Seria a mesma coisa que ficar no casco do barco. Pensei então em nadar para a ilha do Caboclo, mas mudei de ideia novamente, pois o vento era forte e iria me atrapalhar. Então nadei a favor do vento para então alcançar o Humaitá, por ser terra firme.

Quando cheguei perto da Ponta da Coroa estava nervoso, tenho duas cirurgias nos dois braços. Tentei ficar em pé já estava exausto para ver se dava pé, e para a minha surpresa a água já batia nos meus joelhos. Olhei em direção onde estava meu barco, vi um barco de Barra de São João que também estava pescando. Perguntaram se estava tudo bem comigo. Disse a eles que sim, me convidaram a subir ao barco deles para que pudessem rebocar o meu barco enquanto estava de fundo para cima. Pois se afundasse naquele local ficaria ainda mais difícil resgata-lo. Então eu disse: ‘Não meus filhos, fico muito agradecido. Mas amanhã virei com meus amigos e com certeza tiraremos daquele lugar’. Disse isso pois naquele momento eu já tinha ficado satisfeito em estar salvo, o que considero um milagre.

Como insistiram fui com eles no barco. O mar estava calmo. Me ajudaram a colocar as redes para dentro do barco deles. Pegamos o cabo que estava amarrado na proa e puxaram o meu barco para sudoeste do Caboclo. Pedi que parassem ali, para não quebrar a casaria do barco. Ao parar o barco o ar que estava mantido dentro fez com que ele virasse de volta. Esse local foi ideal, para que no dia seguinte meus amigos me ajudassem a resgatar e consertar o barco, que já está pronto para voltar a pesca, assim como eu.

Noticiário das Caravelas

Coluna da Angela

Angela é uma jornalista prestigiada, com passagem por vários veículos de comunicação da região, entre eles a marca da imprensa buziana, o eterno e irreverente jornal “Peru Molhado”.

Coluna Clinton Davison

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