O público que visitar o Centro Atlântico de Arte Moderno, em Las Palmas de Gran Canaria, na parte insular da Espanha, a partir desta quinta-feira (30), vai poder conhecer um pouquinho da porção de terra que existe no outro lado do Atlântico, mais precisamente em Armação dos Búzios. Isso porque a casa de cultura europeia começa a receber a exposição da artista plástica paulistana Paula Scamparini, do Projeto Matriz, que há dois anos mora no balneário, com o filho pequeno.
Composto por fotos, instalações e vídeos, o trabalho da artista é baseado nas suas vivências e conexões pessoais obtidas nos locais em que morou ou fez residência artística, em quilombos e áreas indígenas no Brasil e em países da Europa, desde antes da pandemia, mas sob um olhar feminino e maternal. A paradisíaca paisagem buziana da Praia do Forno tem destaque em uma das cinco salas da exposição, chamada “Brincantes”.
O espaço traz obras suspensas, revelando mulheres, em corpos nus, sustentando a outra a partir da comunicação das crianças mais genuína: a brincadeira. Na sala seguinte, de nome “Ninar” onze vozes femininas, uma delas também de uma mulher buziana, estão misturadas, e fazem parte de uma projeção, em que elas estão cantando canções de ninar que embalaram sua maternagem.
Com exclusividade para Prensa, em meio à correria do processo de instalação da exposição, a artista plástica explicou o conceito do trabalho e a influência do modo de viver buziano nas suas imagens. O processo de entrosamento à comunidade local, em uma cidade nova e com um filho pequeno, foram ao encontro das suas pretensões pessoais e artísticas.
“Aos poucos, fui percebendo em Búzios a possibilidade do que eu sempre quis, que é criar comunidade. E aí eu fui muito bem recebida no sentido de acolhimento. E não eram só pessoas, eram mães, famílias e isso me tocou demais e foi se tornando mais forte. Começou a se fazer uma amizade, uma roda de pessoas, que se compunham através das crianças, sempre com pensamento de comunhão, de troca, de construção uma coisa juntos”, revela.
Paula explica que as praias buzianas representam o conceito de prazer que quis imprimir ao trabalho.
“Em ‘Brincantes’, eu tenho 11 imagens de mulheres fazendo o mesmo exercício de brincar. Eu escolhi as praias de Búzios porque é um lugar que se pode estar ao ar livre. Escolhi a nudez que é um símbolo da liberdade, da selvageria das mulheres e também não tinha outra opção. O corpo nu não precisa de nada, qualquer outra coisa é artificio. Sobre a praia, fazia todo sentido, de liberdade, dessa soltura, desse confia uma na outra, sem a sua roupa, sua capa, sem armadura. Sem nada de armadura, botando as pernas pro alto, você joga o peso em cima da outra. E onde mais pensar num lugar de liberdade, de prazer, de deleite, a praia é muito isso, o deleite do corpo”, define.
Exposição vai até 18 de junho
A pandemia de coronavírus revelou uma nova perspectiva para as pessoas, em diversas partes do mundo. E, para uma paulistana, com vivência profissional no Rio e atual residência em Búzios, a artista plástica Paula Scamparini, o ressignificado do momento, também chegou carregado pela ocupação de um novo território: a mulher que se torna mãe. Imbuída da missão da maternagem, ela, que já transitava, nos últimos anos, pelas questões poéticas do feminino, revelando a existência da mulher em multiplicação em diversos papéis sociais, potencializa a interlocução no projeto artístico Matriz, que traz aquela que dá origem a outro ser, que carrega e precisa ser carregada por outras, muitas vezes.
As obras inéditas, fruto de um mergulho na sua carreira, estarão em exposição a partir do dia 30 de março, no Centro Atlântico de Arte Moderno (CAAM), em Las Palmas de Gran Canaria, em território Espanhol. É possível conferir até o dia 18 de junho.
A exposição Matriz se apresenta em cinco salas intituladas: ‘carregadoras, brincantes, ninar’, no segundo andar do museu. O projeto artístico exibe composições fotográficas, instalações e vídeos abordando a jornada existencial feminina, em corpos nus, carregando um projeto de vida, “em busca de sentido”, como pontua a artista, culminando no arcabouço imaginário do papel materno.
A autora que passou boa parte da carreira em residências artísticas na Europa, sempre buscando levar sua identidade nacional nas obras — que já foram expostas em espaços culturais na Áustria e Portugal — encontrou sentido para assumir o papel da maternidade, em 2018, durante um retorno ao Brasil, quando participou de um projeto que tinha como finalidade a peregrinação por partes desconhecidas de sua própria cultura, como terras de aldeias indígenas e comunidades quilombolas, se fixando em Goiás, no Mato Grosso do Sul.
