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“Eu Não Vou Votar”- Uma Nova Maioria Silenciosa?

 

Certa vez, perguntaram a Richard Nixon se ele conhecia o eleitor que tinha votado nele, e que em 1968 fez com que ele se tornasse Presidente da República pelo Partido Republicano. Nixon disse que confiava na “maioria silenciosa”, ou seja, aquele eleitor que não ia às ruas, não protestava, não levantava bandeiras, nem mesmo comentava nada sobre política.

Na época, os Estados Unidos estavam sendo sacudidos por uma grande agitação política e social, a luta pelos direitos civis, o feminismo, os protestos contra a Guerra do Vietnã, entre outros, davam  a impressão a um observador que todos os americanos, de uma maneira ou de outra, estavam debatendo, protestando, falando.

Mas Richard Nixon pensava de maneira diferente. Para ele, por detrás de todo aquele barulho, havia uma multidão de cidadãos americanos que em silêncio, iria decidir, não só aquelas eleições, mas o futuro da América. Nixon ao longo de sua carreira, conseguiu compreender os movimentos destas pessoas.Ele estava certo.

No fim daquele ano, o Partido Republicano havia quebrado um jejum de oito anos sem eleger um presidente. A “maioria silenciosa” havia entendido sua mensagem e lhe dado um voto de confiança. Seis anos depois no entanto, a última imagem de Nixon na Casa Branca, era ele fazendo o seu característico “V “ da vitória, antes de embarcar no helicóptero oficial. Nixon havia acabado de pronunciar um discurso, renunciando ao cargo que fora eleito pela segunda vez, em 1972. O escândalo de Watergate, como ficou conhecida a investigação que conseguiu provar que Nixon havia comandado pessoalmente a espionagem das atividades do Partido Democrata, custou-lhe o cargo, a carreira política e a reputação.

Tudo isso virou história, enredo de filme premiado com o Oscar (Todos os Homens do Presidente, com Robert Redford e Dustin Hoffman), mas uma coisa pelo menos permaneceu de tudo aquilo, “ a maioria silenciosa”. Nixon talvez tenha sido um dos primeiro políticos a colocar um problema muito interessante para a Ciência Política: como se comportam, pensam e agem aqueles que não se manifestam?

Dito de outra maneira, em uma democracia, entende-se o voto como uma manifestação da vontade política do cidadão. É com o voto que sabemos como este cidadão se comporta em relação a um determinado governo. Há o “voto de protesto”, quando o eleitor, por não considerar os candidatos disponíveis aptos a representarem seus interesses, decide eleger um “não candidato”. Nos anos 80, protestando contra a campanha política para Prefeito no Rio de Janeiro, o “Macaco Tião”, um conhecido chimpanzé do Zoológico do Rio de janeiro, teve expressiva votação. Nos anos 60, outro morador do Zoológico, o rinoceronte “Cacareco”, também foi muito votado.

Mas há outra forma de demonstrar insatisfação, ou o desinteresse com as eleições, trata-se do comportamento traduzido no voto nulo, no voto em branco, ou na simples abstenção. No jargão acadêmico, este comportamento passou a ser estudado como “alienação eleitoral”, ou seja, aquele comportamento eleitoral onde não há participação no processo eleitoral traduzido na abstenção, na anulação do voto, ou no voto em branco.

Vários estudos têm apontado um crescimento deste tipo de comportamento em todo o mundo, e não apenas no Brasil. Para alguns estudiosos, este comportamento indica que determinados índices de não participação eleitoral são não apenas aceitáveis, mas até mesmo desejáveis para a estabilidade democrática. Por quê? Segundo estes estudiosos, se todos quisessem que seus interesses fossem representados politicamente, a fragmentação eleitoral poderia colocar em risco a própria estabilidade do sistema político. Digamos que houvesse tantos partidos, quanto mais diversos fossem os interesses e as demanda eleitorais. Isso iria provocar uma sobrecarga do sistema político, algo muito parecido com o que acontece quando um sistema elétrico recebe uma demanda muito grande do uso de energia. O que acontece em seguida? Um curto circuito, ou pior, um colapso das instituições democráticas, como foi o caso, por exemplo, da ascensão do Nazismo na Alemanha.

Quem efetivamente votou em Adolf Hitler, talvez seja a questão mais revisitada na Ciência Política moderna, pois  essa pergunta remete ao fato da possibilidade de um sistema democrático criar as condições para a sua própria destruição? Não custa lembrar que no caso alemão, Hitler não chegou ao poder por força de um golpe militar, mas de uma eleição. Talvez, se não houvesse uma competição política tão intensa, como foi o caso do que aconteceu durante a República de Weimar, os nazistas não tivessem conseguido aquela vitória. Talvez, talvez.

Outra linha de interpretação entende o fenômeno da alienação eleitoral como um sinal de déficit de legitimação do regime democrático, indicativo de desagregação do sistema político. O que isso significa? Basicamente, existe quem defenda que quanto menos legítimo é um sistema político, menos estimulados os eleitores se sentem para participar de um pleito. Se o jogo político não apresenta novos personagens, se no final das contas, a política não passa de um jogo de “cartas marcadas” e o debate não se renova, o eleitor raciocina da seguinte maneira: “afinal de contas, o que eu ganho com isso?”

Sistemas políticos dominados por grupos que estão há muitos anos no poder geram este tipo de comportamento. Por exemplo, em 1998, nas eleições para Governador e Deputado Federal no Maranhão, a abstenção eleitoral chegou a 73%. Ou seja, o eleitor, em grande maioria simplesmente não foi votar, exatamente porque acreditava que o poder do seu voto, não seria capaz de retirar do poder uma oligarquia tão enraizada na vida política do Estado, como a  família Sarney. Mas isso não se limitou ao Maranhão. Diga-se de passagem, desde a retomada das eleições com a redemocratização, a partir da década de 80, os maiores índices de abstenção estão localizados nos estados das regiões Norte e Nordeste. Estados como Amazonas, Maranhão, Piauí, Rondônia e Bahia, a alienação eleitoral ultrapassou 50%. Em 1998, 52%, ou seja, mais da metade dos eleitores simplesmente deixou de votar no Nordeste.

Em tese no Brasil, o voto é obrigatório, mas isso não impede que a alienação eleitoral, ou seja,  o somatório dos votos brancos e nulos, seja bem alta. Em 1989, 15 milhões de eleitores inscritos, se abstiveram, votaram em branco ou anularam o voto. Feitas as contas, o total de votos brancos e nulos, mais as abstenções foi maior do que o total de votos do segundo colocado, Luis Inácio Lula da Silva. Portanto, dizer que Collor ganhou as eleições de 1989 apenas com manipulação eleitoral, principalmente do debate televisionado, não parece bater com os dados.

Em 1994, Lula foi mais uma vez derrotado no 1° turno, desta vez por Fernando Henrique Cardoso, e os votos nulos, brancos e as abstenções somaram mais do dobro dos votos recebidos por Lula. Quatro anos depois, em 1998, a alienação eleitoral atingiu 40% do total dos votos, e mais uma vez, Lula foi derrotado no 1º turno, com um número de votos brancos e abstenções maior do que os votos em Lula.

Em 2002, quando Lula foi eleito pela 1ª vez, o 3º e o 4º candidatos tiveram menos votos do que o total de votos brancos, nulos e abstenções. Em 2006, pesquisa do IBOPE revelou que 11% dos eleitores disseram que não iriam votar, ou simplesmente anular seu voto. É possível argumentar que estes números estavam ligados à repercussão do “escândalo do mensalão”, mas isso não seria suficiente para explicar este comportamento. Atualmente, as pesquisas de opinião para as eleições de 2018, têm detectado sistematicamente uma percentagem bem alta de intenção de não votar, mais uma vez devido em parte, aos desdobramentos da Operação Lava Jato.

Este padrão se repete, tanto a nível estadual, quanto municipal. Por exemplo, nas últimas eleições para Prefeito, em quase todas as cidades brasileiras, a abstenção atingiu respeitáveis 40% do eleitorado.

Há mais ou menos 10 anos, muitas autoridades têm manifestado preocupação com este tipo de comportamento. Por exemplo, o TSE iniciou a campanha, do “Vota Brasil”, incentivando os eleitores a participarem das eleições. Em vários segmentos da sociedade civil começaram a surgir movimentos pela defesa do Voto Nulo. Em universidades como USP e a Unicamp foram criados comitês pelo Voto Nulo, ensinando inclusive a como anular o voto na urna eletrônica.

Enquanto escrevo esta coluna, está sendo realizada em Cabo Frio e Rio das Ostras, eleições suplementares. Seja qual for o resultado, a abstenção ou alienação eleitoral parece que será bem grande.

Creio também que este comportamento eleitoral é uma pequena amostra do que virá nas eleições de outubro deste ano. Esta “maioria silenciosa”, como dizia Nixon por enquanto é entendida como uma massa compacta de eleitores pouco interessados, pouco escolarizados e ignorantes da política. Mas se a História tem alguma utilidade nos dias que correm, creio que Richard Nixon estava certo, quando dizia que sabia como se comportava esta “maioria silenciosa”.

Richard Nixon foi sacado da presidência no primeiro e até agora, único processo de impeachment na história dos Estados Unidos. Pouco antes de morrer, ele dizia que nenhum político deve subestimar a força desta maioria silenciosa. Acho que ele tinha razão.

 


Professor Paulo Roberto dá aulas de história para o ensino médio em Cabo Frio

 

Noticiário das Caravelas

Coluna da Angela

Angela é uma jornalista prestigiada, com passagem por vários veículos de comunicação da região, entre eles a marca da imprensa buziana, o eterno e irreverente jornal “Peru Molhado”.

Coluna Clinton Davison

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