Não se ouve mais o ruído de máquinas trabalhando na Restinga de Zacarias, desde o fim de maio, quando o ministro Herman Benjamin, do Superior Tribunal de Justiça (STJ) emitiu liminar que suspendeu as licenças ambientais e determinou a paralisação das obras de construção de um resort na Área de Proteção Ambiental (APA) de Maricá. Contudo, a tranquilidade no rico ecossistema costeiro pode ser interrompida em breve, já que a empresa responsável pelo empreendimento Maraey, a IDB Brasil, anunciou que vai recorrer da decisão.
A decisão do magistrado atende a um pedido do Ministério Público Estadual (MP-RJ) contra o Instituto Estadual do Ambiente (Inea), o Estado do Rio de Janeiro, o município de Maricá e a IDB Brasil. O megaempreendimento de R$ 11 bilhões foi projetado para ocupar uma área de 840 hectares na Fazenda de São Bento da Lagoa, entre a Praia da Barra de Maricá e a Lagoa de Maricá. O complexo seria composto de hotéis, clubes, shoppings, campo de golfe, centro hípico, prédios e casas residenciais, restaurantes e escola.
A área é considerada de grande valor científico e ambiental por estudiosos e ambientalistas, pela presença de inúmeras espécies endêmicas da fauna e da flora, o que tem motivado a reação de conselhos e quadros técnicos de universidades públicas, como Uerj, UFRJ e UFF. Na sentença, o ministro Herman Benjamin citou a possibilidade de danos permanentes na APA, em caso de continuidade dos trabalhos.
“Eventual lesão econômica pode ser reparada; a lesão ambiental, por sua vez, jamais poderá ser restaurada caso executados os trabalhos de construção civil, ante o impacto que provocam. Confrontados o interesse privado e o público, deve-se privilegiar este – que é irreparável – em detrimento daquele. Havendo o prosseguimento da construção, corre-se o risco de autorizar provimento apto a macular a fauna e a flora locais de maneira irreversível”, manifestou-se.
Por sua vez, o Grupo IDB Brasil alega que detém todas as licenças “após um longo processo administrativo promovido pelo Instituto Estadual do Ambiente (INEA) e pela Prefeitura de Maricá, além de serem ratificadas por inúmeras decisões do Poder Judiciário”.
A empresa garante ainda que vai buscar reverter a decisão, e se diz comprometido com as demandas sociais e ambientais da região em que pretende se instalar.
Em nota, a empresa afirma ter recebido “com enorme tristeza” a paralisação do empreendimento; e que a decisão monocrática impacta não apenas o resort, como também a segurança jurídica dos demais investimentos e projetos estratégicos para o Estado do Rio, assim como o desenvolvimento sustentável do turismo.
“A IDB reafirma que vai buscar todos os meios legítimos e legais para reverter esta decisão que impacta, não apenas Maricá ou o Estado do Rio de Janeiro, como também o desenvolvimento turístico do Brasil, e retomar as obras do empreendimento turístico-residencial sustentável que já está se tornando referência para futuros licenciamentos no país e no mundo”, diz o comunicado.
A Prefeitura de Maricá e o Governo do Estado, pro meio do Inea, optaram por uma posição conservadora a respeito da decisão judicial e declararam que ela deve ser cumprida. O governo municipal informou que respeita a decisão da Justiça e o que caberá ao Executivo será respondido dentro dos autos do processo.
Por sua vez, o Inea confirmou que as licenças ambientais do Resort Maraey foram suspensas por decisão judicial.
As obras do resort haviam sido iniciadas em abril deste ano, após um longo histórico de idas e vindas, iniciado em 2007, quando o primeiro projeto oficial do resort foi divulgado. Naquele mesmo ano, a aprovação do Plano de Manejo parecia ser a concretização do arcabouço jurídico para a construção na área, mas desde então, entidades comunitárias e de defesa ambiental conseguiram vitórias judiciais, amparados na Defensoria Pública e no Ministério Público.
Por sua vez, o IDB Brasil obteve o licenciamento prévio do empreendimento em 2015 e a licença de instalação, seis anos depois. Também em 2021, o STJ restabelece a validade de uma liminar de 2013, que impedia construção na restinga.
A última decisão antes do parecer do ministro Herman Benjamin havia sido em setembro de 2022, quando o Tribunal de Justiça derrubou decisão da Comarca de Maricá e autorizou o empreendimento, o que foi por terra no fim de maio.