Esse sou eu. esses são meus detratores. esse é o momento do confronto. jamais tive medo deles. esse é o registro fotográfico de situações que ocorreram por anos seguidos, sob os auspícios da instituição ” escola” e não apenas esta, mas todas pelas quais passei: ” bichinha”, “viadinho” e outras nomeações baseadas em diferenciação para discriminar. expressões de perversidade infantil que deveriam ser discutidas na escola. Como teriam o direito de me nomear, classificar, reprimir, antes mesmo que eu me definisse? Eu era só uma criança que queria jogar bola e brincar com todos e todas. mas havia ali o grupo dos pequenos fascistas, dos que precisam dos guetos para se sentirem soberanos, que precisam dividir para conquistar. Muitos desses que nomeavam, humilhavam e xingavam passavam por problemas familiares alheios ao conhecimento da escola. Jamais me dobrei. Enverguei por vezes. Quem pois seria capaz de saber mais de mim do que eu mesmo? Quem teria o direito de me encaixar em um rótulo ou estereótipo?
Tive a graça de ter uma mãe e um pai que me fornecerem as condições físicas, materiais e psicológicas para que eu desenvolvesse a minha própria personalidade. Essa segue sendo hoje minha inspiração de luta e filosofia de vida. Aprendi com eles a construir minhas próprias caixas e rótulos, ter consciência da existência deles e o quanto podem ser prejudiciais ou benéficos. Aprendi e aprendo a ser eu mesmo.
As terapias de reorientação sexual foram autorizadas por liminar ainda que a homossexualidade não seja considerada patologia pela Organização Mundial de Saúde desde 1990. A transexualidade permanece classificada como patologia no Código Internacional de Doenças. Combater os preconceitos e o ódio passa longe de qualquer proposta. Pelo contrário, é alimentado e incensado. Crianças e adolescentes são vítimas objetivas de pseudoterapias de “reorientação sexual” ou “cura gay”, na medida em que na maior parte das vezes dependem para a sua re (existência) de famílias em medida parte LGBTfóbicas.
O kit anti-homofobia foi descartado pelas forças conservadoras. orientação sexual e identidade de gênero foram arrancadas a golpes do Plano Nacional de Educação e da Base Nacional Curricular. Exposições como o Queermuseum e de fotos no castelinho do Flamengo têm sido desmontadas, vetadas e vilipendiadas. liberdade de expressão e direitos humanos tornaram-se clandestinos.
O que foge à lógica da ignorância, do fascismo e do fundamentalismo é discutir com crianças e adolescentes a respeito da possibilidade de ser, desejar, construir sua personalidade e viver fora dos padrões heteronormativos. De encontrar modos e formas de vida fora de normas e construções culturais muitas vezes violentas e incongruentes com o próprio desejo de vida.
A infância que contesta a construção cultural de gênero estabelecida pela heteronormatividade é realidade. a questão não reside nas crianças e sim como crianças e adultos reagem à diversidade como fato real. Reagem ao desejo, ao comportamento baseados em normas heteronormativas violentas. Adolescentes que se assumem LGBT são realidade. São vida. Em todo canto, e sempre.
Desejo é vida. É a força que movimenta ainda que tentemos mascará-lo, reprimi-lo, para nos adequar a convenções sociais, para sermos aceitas e amadas.
Estamos em luta. e eu permaneço como nesta foto. Não adoeçam. Não se deprimam. Fiquemos juntas, e juntos sendo quem somos. Merecemos ser nós mesmas e o mundo merece também. Aí reside a essência de um mundo plural, a essência da verdadeira democracia.
Leia também o texto de Hamber Carvalho, pai do Henrique, e também advogado e ativista
https://prensadebabel.com.br/index.php/2017/06/13/o-orgulho-de-ser-pai-de-um-filho-gay/