Fotos e vídeos apontam proporção da substância que está provocando mudança na coloração e mau cheiro do corpo hídrico, e serão juntados como prova para uma possível Ação Civil Pública
A presidente da Comissão de Meio Ambiente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) – Búzios, que também integra a equipe do Movimento SOS Rio Una, Carolina Mazieri, se reuniu na segunda-feira (31) com o ambientalista e ativista, Ernesto Galiotto. O objetivo foi fazer uma análise inicial das imagens do sobrevoo feito por ele, a pedido do Movimento, para verificar a proporção da substância que está provocando mudança na coloração, mau cheiro e espuma no corpo hídrico do Rio Una, dando indícios de crime ambiental. As fotos e vídeos serão juntados como prova de uma possível Ação Civil Pública (ACP).
O Una nasce em Araruama passa por Iguaba Grande, Cabo Frio e São Pedro da Aldeia. A foz está localizada na Praia da Rasa, em uma área da Marinha no território de Cabo Frio, mas próxima do limite do município de Búzios. O sobrevoo foi realizado na quarta-feira (25) em toda a extensão do corpo hídrico do Una, desde a Estação de Tratamento e Esgoto (ETE) do Jardim Esperança, em Cabo Frio, registrando o Córrego da Malhada, passando pela Praia Rasa, seguindo pelo Córrego Flexeiras, em São Pedro da Aldeia, até o Rio São João, que faz limite entre os municípios de Cabo Frio e Casimiro de Abreu.
As imagens constataram a dimensão da mancha escura da foz do Una, na Praia Rasa, seguindo pela Praia Gorda e avançando até a Ponta do Pai Vitório, em Búzios. Outro trecho detectado é na entrada da Agrisa, em Cabo Frio, onde a coloração é ainda mais escura e com maior odor.
Segundo Carolina, essas imagens serão anexadas as outras comprovações das análises de coleta da água, já feitas pelo grupo e também por alguns órgãos, como Inea e prefeituras de Cabo Frio e Búzios, na semana passada, e Ministério Público Federal (MPF), na terça-feira (1º).
“Não nos parece ser um problema somente de esgoto, essa mancha parece que tem outra coisa, porque tem uma cor muito escura e uniforme com cheiro forte, talvez uma semelhança de óleo ou algum produto químico. Eu não sou técnica, mas outros técnicos e pesquisadores que estão envolvidos nessa investigação irão analisar para detectar o tipo de material”, explicou a presidente da Comissão de Meio Ambiente da OAB-Búzios.
Ainda de acordo com Carolina, houve uma demora por parte das autoridades municipais, regionais e estaduais para verificar o problema, que foi percebido a partir de 14 de janeiro, quando o Movimento SOS Rio Una começou a receber as denúncias, fotos e vídeo de que a saúde do rio estava sendo prejudicada.
“Houve uma demora das autoridades para se movimentar e nós, do Movimento SOS Rio Una, decidimos começar uma investigação por conta própria. Percorremos uma boa parte do Rio, da foz passando pelo trevo e subindo para Agrisa, um dos pontos onde o mau cheiro é muito pior. Conversamos com moradores, que falaram que não veem mais os peixes com a mesma frequência de antes e que os caranguejos não ficam mais na água”.
Carolina ressalta ainda, que precisa aguardar o retorno das análises, mas, enquanto isso, novas vistorias serão feitas em outros pontos para verificar outras suspeitas, entre elas que a substância poluidora pode estar vindo de alguma das empresas próximas à Agrisa. “São apenas indícios que, se comprovados, também serão provas”.
Solução para poluição
Na visão do ambientalista, Ernesto Galiotto, a solução para evitar a morte definitiva do Rio Una são estudos e investimentos. Para ele, a construção de ETEs em pontos estratégicos é fundamental para a vida do corpo hídrico.
“O Rio Una tem grande importância para a nossa região. Ele nasce e desagua no estado, precisamente nasce em Araruama, corta os municípios de Iguaba, São Pedro da Aldeia e Cabo Frio com foz na Praia da Rasa, em Búzios. Há anos que eu falo que o Rio Una tem vida curta. As estações de tratamento são pequenas para o tamanho da Região, principalmente a ETE do Jardim Esperança. A população cresceu muito e vai crescer ainda mais nessa região. É preciso construir duas ETEs: uma na parte de cima do Jardim Esperança, naquela área de fazendas ampliando o tratamento dos resíduos; a segunda é perto da Fazenda Campos Novos, ou próximo a garagem da 1001, no distrito de Tamoios, área que está crescendo muito”, opinou Galiotto.
A Prolagos explicou que a região conta com três estações de tratamento para atender a população urbana sob responsabilidade da concessionária: duas em Cabo Frio e uma em Armação dos Búzios. As estações funcionam de acordo com as respectivas licenças de operação e têm capacidade para tratar 760 mil litros de esgoto por segundo. Ainda de acordo com a concessionária, todo investimento considera o crescimento das cidades a longo prazo e as expansões futuras estão previstas.
Mas, segundo Ernesto, não é o esgoto da Região dos Lagos que pode ser a causa da poluição. Para ele é preciso investigar se o Canal do Medeiros, que vem de Rio das Ostras e corta Barra de São João, em Casimiro de Abreu, também pode ser a causa do problema, porque desemboca no Rio São João, que faz limite com o município de Cabo Frio.
“Foram investidos, recentemente, milhões para recuperar o Canal dos Medeiros, que não adiantou de nada. Casas foram construídas à beira do rio e ainda foi tirada a vegetação no fundo, que seria o filtro da poluição. É preciso ampliar a investigação, porque o resíduo jogado no Rio São João pode sim chegar à Búzios através da correnteza”.
Questionada, a Prefeitura de Rio das Ostras informou, por intermédio da Secretaria de Meio Ambiente, Agricultura e Pesca, que o Canal do Medeiros possui baixíssima velocidade de escoamento superficial e apresenta pouca contribuição quanto a poluição. Alia-se a este, o fato do poder de diluição das correntes marinhas.
Quanto à questão de projetos futuros, Rio das Ostras e o Inea iniciaram, desde 2018, o Plano Municipal de Saneamento, que se encontra em análise junto ao Inea. A cidade também foi inserida no Lote 3 do Programa Estadual de Concessão da Cedae. A empresa vitoriosa foi Águas do Brasil e nesse contrato estão previstos a vertente água e o tratamento de esgoto.
Coleta de amostras
Na terça-feira (1º), a equipe do Ministério Público Federal (MPF), comandada pelo promotor Leandro Mitidieri esteve em Búzios. Amostras foram colhidas na foz do Una e na Praia do Canto. O resultado está previsto para cerca de 15 dias. O Inea também acompanhou o trabalho.
Na semana passada, o próprio Inea fez a coleta do material, assim como as prefeituras de Cabo Frio e Búzios. Os resultados devem sair em torno de dez dias. No entanto, o Instituto estadual adiantou que, em todas as amostras coletadas, o Oxigênio Dissolvido (OD) se apresentou abaixo de 1 mg/l, estando fora do padrão mínimo (5 mg/l) recomendado pela Resolução CONAMA 357/2005 para manutenção da vida aquática.
A Prefeitura de Búzios também disse que durante a coleta, feita na sexta-feira (28), no córrego da Malhada, no Jardim Esperança, na foz do rio, na Rasa, e na estrada da Agrisa, em São Pedro da Aldeia, foi identificado um volume muito grande de matéria orgânica, com águas em condições mínimas, com oxigênio abaixo de zero.
A Prolagos também analisou a situação e constatou que a alteração está presente em toda a extensão do Una, inclusive, antes do Canal da Malhada, corpo receptor do efluente tratado na estação do Jardim Esperança. A concessionária disse que vem acompanhando o caso e está trabalhando em conjunto com os órgãos ambientais.
O resultado das amostras do Movimento SOS Rio sairá no próximo sábado (5).
Falta sinalização na Praia Rasa
O Movimento SOS Rio Una recebeu relatos de moradores, pescadores, marisqueiras e de praticantes de esportes que estão preocupados com o futuro do rio, que é fonte de subsistência para muitas famílias e usado para irrigar plantações e alimentar animais. Além disso, existe a preocupação com a saúde das pessoas que, sem saber, então entrando na água.
“Há depoimentos de pessoas que fazem canoa havaiana e kitesurf que entraram na água e passaram mal depois. Tem muitas pessoas entrando na água. É preciso que as autoridades, Defesa Civil, Inea, Secretaria de Meio Ambiente sinalizem a área até que seja detectado o problema”, pede Carolina.
Além disso, ela sugere que seja incluído no programa de políticas públicas do município as coletas das amostras para acompanhamento da qualidade da água, seja com verba do Conselho Municipal de Meio Ambiente ou de alguma outra forma, que poderia ser mensalmente, ou em alguma outra periodicidade, para que não se dependa somente de órgãos estaduais ou federais.
A Prefeitura de Búzios disse que a foz do rio é território de Cabo Frio, mas que oficiou a cidade cabo-friense para assinatura de um termo de cooperação técnica para que possa haver a instalação de placas. Além disso, explicou que a inclusão da análise da água como parte de ações do Conselho já era algo pensado pela Secretaria de Meio Ambiente e que será implementado em breve.
A Prensa entrou em contato com os municípios de Cabo Frio, Iguaba Grande, São Pedro da Aldeia e Araruama para atualizar os andamentos das investigações, mas até o momento não houve retorno.
A polêmica da transposição
A possibilidade do remanejamento dos efluentes da Lagoa de Araruama para o Canal da Malhada, no Jardim Esperança, é uma preocupação da população buziana e dos ativistas ambientais do município. O projeto de transposição proposto pelo Consórcio Municipal Lagos São João (CILSJ) é visto por Ernesto Galiotto como a morte de vez do rio, porque, segundo ele, não há vazão.
Desde o ano passado, a Prolagos descartou a possibilidade de transpor o lançamento de efluentes tratados para o Rio Una, após estudo apontar inviabilidade técnica. Qualquer alteração no sistema de esgotamento sanitário é uma decisão das prefeituras, explicou a empresa por meio de nota.
Galiotto destacou ainda que o fato do Una não passar por dentro de Búzios não diminui em nada a preocupação, pelo contrário só aumenta, porque a cidade recebe a pior parte por receber toda a água em suas praias.