Com roda de Capoeira e de jongo da Associação Raízes de Aruanda, foi inaugurado o busto de Carukango, liderança quilombola do Norte e Noroeste Fluminense, em frente ao Centro Cultural do Legislativo, antiga sede da Câmara Municipal de Macaé. Depois do evento, na manhã de sexta-feira (29), o grupo Terreiro de Crioulo apresentou um show comemorativo na Praça Washington Luiz.
A instalação do busto de Carukango pela Prefeitura tem o objetivo de fazer conhecer e reconhecer a história do líder quilombola que havia sido sequestrado na África para ser escravizado. Segundo historiadores, várias personalidades negras, como Carukango, integravam as realezas de seus povos no continente africano. No Brasil, ele estabeleceu seu quilombo na Serra do Deitado, na região serrana que compreende os municípios de Macaé e Conceição de Macabu. O Quilombo Carukango foi, historicamente, o segundo maior do Brasil e o maior do Estado do Rio de Janeiro.
O busto foi descerrado pelo prefeito Welberth Rezende. “Estou muito feliz em inaugurar o busto de Carukango. Nossa história não foi corretamente contada. Temos que reconhecer parte de nossa história com a força de homens e mulheres negras que trabalharam para fazer o país chegar aonde chegou. Precisamos avançar na educação, incluindo os nomes de negros que fizeram a cidade ser o que ela é. Parece singela uma estátua de bronze, mas simboliza muito como resistência, sendo colocada em uma área que era escravagista”, disse.
“Avançamos muito com a criação da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, a única do Estado do Rio de Janeiro, dando autonomia e muito mais força a políticas públicas contra o racismo. Além disso, em um dia no mês, as 42 mil crianças das escolas públicas municipais têm um cardápio especial baseado na culinária africana, o Nutriafro. Momento em que contamos um pouco da história”, acrescentou.
A secretária de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Zoraia Braz, ressaltou a relevância da ação para a valorização da história e da cultura afrodescendente. “Para além do empoderamento, é a reafirmação da resistência, porque este espaço pertenceu a um mercador de escravizados, alguém que tirou nossa história. Estamos aqui pela nossa ancestralidade, pelos que vieram antes de nós”, frisou.
Representando o Instituto de Pesquisa das Culturas Negras (IPCN), a professora Doutora Sônia Santos destacou: “Esta homenagem é muito importante, porque resgata a nossa história. É preciso que toda a população macaense se orgulhe de sua história. Tive a oportunidade de contribuir com este processo, desde a criação da Corafro e de cursos de Pós-Graduação”.
O prefeito, Sonia Santos e Mestre Dengo, do grupo de Capoeira Raízes de Aruanda, com mais de 20 anos de funcionamento, receberam a placa comemorativa do evento. “Nós fomos proibidos de fazer capoeira. Proibidos de nos manifestar dentro de nossa cultura e nossas crenças. Mas estamos firmes com este movimento em Macaé desde a década de 70. Temos que resistir a todo o momento”, reforçou o capoeirista.
A coordenadora de Cultura Afro-Brasileira e Indígena nas escolas da Rede Municipal de Ensino, Kátia Magalhães, considera a homenagem uma reparação histórica. “Estou aqui para reverenciar a força, a coragem e a resistência de um líder negro, moçambicano, que lutou por liberdade. Todos nós somos Carukango, que vem nos dizendo que é possível. Houve um tempo em que não poderíamos estar reunidos. Hoje estamos aqui, em uma praça pública, inaugurando o busto de quem lutou por liberdade”.
Também receberam a placa comemorativa do evento: a coordenadora de Políticas para a Igualdade Racial de Quissamã, Jovana de Azevedo; o vereador Edson Chiquine; a vereadora Iza Vicente e o assessor Jurídico da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Dorniê Matias. Estiveram presentes: a secretária de Políticas para as Mulheres, Sheila Juvêncio; o secretário do Procon, Gilcemar Prata; o coordenador do Escritório de Gestão Indicadores e Metas de Macaé, Romulo Campos, entre outras autoridades. Após a inauguração houve show comemorativo do grupo Terreiro de Crioulo, na Praça Washington Luiz.
História, cultura e turismo
O gestor do Centro Cultural do Legislativo e Doutor em Memória Social (UNIRIO), Meynardo Rocha, explica que o prédio onde hoje funciona o Centro Cultural do Legislativo foi originalmente a casa de um mercador de negros escravizados em África, Francisco Domingues de Araújo. “Em 1827, o português primeiro se instalou no Rio de Janeiro, onde seu irmão tinha negócios. Ele considerou a recém-criada Vila de Macaé uma praça favorável aos negócios, pois se abria para as regiões agrícolas que estavam em processo de produção ou de implantação. Por isso, ele se transferiu para Macaé, em 1928, e recebeu autorização da Câmara Municipal para construir uma casa que se tornou a mais bonita de Macaé por muitos anos. Ela chegou a receber a visita de D. Pedro II, em sua primeira viagem ao Norte Fluminense, em 1847. Comercializando negros escravizados, ele se tornou milionário”.
A turismóloga especialista em conteúdos sobre Macaé, Grazielle Hegueduch, informou que o busto de Carukango, instalado em um local construído por pessoas escravizadas, será um ponto de visitação turística, histórica e cultural. “Os povos originários e o povos afrodiaspóricos não constam de nossa história e, quando constam, como facínoras, silvícolas ou criminosos. Então, é importante que se resgate e ressignifique esta história e se dê valor a estas pessoas que são de fato heróis. Muitas vezes, fala-se da violência que eles usavam, mas era a violência que eles recebiam. Foram pessoas sequestradas, comercializadas e espancadas sem direito de se defender. Lutavam com as armas que tinham. Lutavam pela sua liberdade e de seus iguais”, reforçou.