Em 1983, o cientista político Norberto Bobbio, um dos mais conceituados do mundo, já alertava para a crise da democracia representativa. Em seu bom livro, “Qual Socialismo ?”, ele constatava a da apatia da população italiana, que não se ligava na política de seu país.
Para Bobbio, a democracia se burocratizara cada vez mais ao tentar cobrir diversas áreas das necessidades humanas, sempre maiores em sociedades mais complexas. A burocracia, pesada e obedecendo leis internas próprias, conduzida por um número cada vez maior de funcionários, geraria nos cidadãos uma desilusão perigosa com a democracia e desenvolveria uma afeição por ideologias totalitárias de esquerda e direita. Weber tinha previsto exatamente isso 70 anos antes ao falar do chamado desencanto com a política moderna.
Na concepção de Bobbio, as sociedades de massa criariam inevitavelmente a figura do cidadão amorfo, aquele que não se liga em nada que não seja o seu dia a dia, causando um fosso entre a representação política e a grande massa de cidadãos, o que, por conseguinte, colaboraria para um afastamento cada vez maior entre a sociedade e as coisas da res publica. .
Bobbio não via saída para este problema nas democracias ocidentais nem mesmo na disseminação da democracia direta, a qual, para ele, acabaria dominada por uma minoria de pessoas politizadas e por grupos de interesses, o que ergueria uma espécie de oligarquia política que tenderia a impor sua vontade sobre a grande maioria amorfa, desinteressada de uma participação mais efetiva em um mundo cada vez mais conturbado por ideologias seccionais, propagandas e ilusões consumistas.
A crítica de Bobbio aos problemas criados pela democracia e pela sociedade de massas nunca esteve tão válida para o Brasil, onde vemos o crescimento ou mesmo a permanência de um forte tendência autoritária de esquerda e de direita em muitos setores da sociedade. O sentimento de que a democracia fracassou explicaria a apatia política das grandes massas com o regime ou seria o inverso ? Se a tendência à indiferença e ao mesmo tempo ao sentimento de desilusão com a democracia abatia a rica e educada sociedade italiana dos oitenta, imagine numa sociedade cheia de problemas sociais e educacionais como a nossa.