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por Camila Lamas ([email protected])

 

Hoje eu li porque raramente assisto televisão que o presidente eleito disse que não tem fome no Brasil! Eu olhando de cima do meu privilégio de nunca ter sentido fome poderia acreditar que ele está certo, não há fome no Brasil e ponto.

Mas a minha história não foi bem assim, eu nunca senti fome mas eu sempre vi a fome de perto.
Nasci em uma família espírita cujo altruísmo era eminente e a caridade parte do dia a dia.

A primeira vez que minha avó viu a fome de perto foi auxiliando os trabalhos de um centro espírita que atendia as famílias do maior morro da capital, hoje são 800 registradas, depois ela comprou um sítio no interior de Minas Gerais e uma moça acreditando que ela era rica veio ao seu encontro pedir ajuda pois ela e seus filhos tinham fome. Foi quando a minha avó ajudou com uma cesta básica a primeira família que morava próximo a porteira do sítio.

Quando eu nasci já eram 100 famílias da região assistidas que já não tinham fome pois minha avó dedicou a sua vida a mudar essa realidade mas não era só comida que ela dava, era coberta, era roupa, era brinquedo no Natal e pipoca no Dia das crianças.

Minha mãe se mudou pra esse sítio quando eu tinha 9 anos e essa realidade passou a ser minha.
Quando eu tinha 10 ela entrou pra vida política e da secretaria de turismo foi para a de assistência social onde continuou seu trabalho pela luta em prol das crianças e adolescentes.
Foi quando eu estive mais perto da fome e não só da fome mas da violência sexual, prostituição de crianças e adolescentes, violência física e psicológica, crime, droga, marginalidade e tudo começava na fome.

Nessa mesma época eu conheci um motorista da secretaria de assistência social, senhor simpático de coração do tamanho do mundo, humilde e que contou com os olhos marejados a minha mãe que na sua infância a mãe dele chegou a cozinhar barro com raiz e água e colocar no prato pra eles comerem pra tentar encher a barriga dele e dos seus irmãos que choravam de dor por não comer há dias.

Eu também me lembro na minha infância de uma moça que ajudava minha mãe na casa dos meus avós paternos quando morávamos na capital e apareceu com a cabeça rachada por uma panelada que a sua mãe lhe deu pois não voltou com dinheiro pra casa pra alimentar a família que tinha fome.
Meu pai morava na capital e eu morei ali antes dos 9 anos, depois dos 17 e sempre andei pelas ruas cheias de crianças pedindo esmolas, adolescentes pedindo lanches, mães com bebês no colo pedindo leite e fralda, assaltos todo o tempo.

Meu irmão sempre foi assaltado e minha mãe explicava pra ele com a maior calma do mundo que não sentisse ódio e imaginasse como é a vida de quem não tem o que ele tem ou sempre teve, fome, frio, dor, falta de amor, colo de mãe, escola, lazer, brinquedos… Eles tinham ódio e por isso machucavam, que meu irmão perdoasse e crescesse pra um dia poder ajudar.

Um dos amigos de infância do meu irmão morava no morro, era filho da moça que trabalhava para o meu pai e veio a tirar ele de uma briga anos depois, adolescentes do morro que distribuíram violência gratuita depois de um show de rock e meu irmão estava apanhando.

Quando eu penso em fome a primeira imagem que me vem a cabeça são das crianças na África, com as costelas expostas, os urubus por perto, essa fome eu nunca vi de perto mas não vai ser ignorando a fome que vamos mudar a realidade que existe no Brasil.

A minha família combate a fome de 150 famílias há 50 anos no interior de Minas Gerais junto com amigos, parceiros, irmãos que estão sempre somando ao desejo da minha avó já falecida há 3 anos de ajudar o próximo.

E o nosso presidente, o que faz para combater a fome do Brasil além de ignorar a sua existência?

Noticiário das Caravelas

Coluna da Angela

Angela é uma jornalista prestigiada, com passagem por vários veículos de comunicação da região, entre eles a marca da imprensa buziana, o eterno e irreverente jornal “Peru Molhado”.

Coluna Clinton Davison

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