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O incomodo do discurso desentendido, virtual, mas, mesmo assim, capaz de machucar. Virtual por saber que contém quase nenhuma informação real, falas perdidas e muitas vezes sem propósito, e que são trocadas através da rede, as sociais, e as de conversa.

Eu fui chamada de afro bege e me incomodou, pois era eu novamente, uma pessoa sem cor, não era branca, mas também não era suficientemente preta. Lidando com o militante jovem, entre 16 e 19, percebi o discurso afro bege muito mais incisivo, tratado como uma brincadeira por eles, mas completamente nocivo pra mim.

Já estava a três anos na militância, e nunca tinha sido tão atingida por pessoas que eu acreditei serem aliados. De primeira eu tive a resistência a esse discurso, não queria ser sem cor, mas ao perceber a falta de argumentos, eu me vi satisfeita, por saber que eu não era retinta, que não era branca, que tinha nariz achatado, mas cabelos finos, por saber que eu era Talytha, me custou três anos de militância individual.

Muitas vezes, sozinha, me assegurava de amor e certezas, que só eu poderia me dar e tirar, eu sabia quem eu era. Seria eu uma fala sem sentido de internautas? Ou seria eu a pessoa que vinha construindo e escrevendo coisas? Mudando com amor a minha e outras realidades?

Diminuir dores, afinal se eu não sou retinta, não sofro tanto, não uso Black, tenho traços mais afinados, apesar de não totalmente, não era eu preta o suficiente. Nessa busca de quem sofre mais, nós, os afro beges, estamos recebendo o discurso do não bonito dos dois lados.

“Talytha você seria mais bonita se fosse retinta”

“Você seria linda três tons mais clara”

“Se tivesse nariz mais afinado, você nem seria preta”

Infelizmente, tive que ler sobre a minha “incapacidade” de entender as dores de um homem preto, que me relacionar com este homem, era afastar ele do real amor preto.

Colocando cor até no amor, tomaram conta do discurso colonizador, enfraquecendo o real movimento, o que realmente se movimenta, o que faz mais do que ofender pelas telas de computador.

Entender que como indivíduos, cada um sabe da sua dor, e movimentarmos para evitar todas, para que os direitos reservados sejam entregues a quem precisa, e se todos precisamos, faremos isso.

Sei quem eu sou, e o que me tornei, o afro bege não me incomoda, eu prefiro ser sem cor, a me ver transformada num opressor. Pra mim pele é epiderme, e só, eu luto por uma história, por um povo silenciado por anos, pelo fim dos enganos policiais, das mortes em hospitais, dos abortos mal sucedidos, onde minha gente ainda é maioria.

O preto é múltiplo e colorido, sorte minha entender e respeitar isso, fazendo o máximo pra mudar. Minha utopia é coletiva.

Talytha Selezia é mulher preta, poeta e integrante do Coletivo Ónix

Noticiário das Caravelas

Coluna da Angela

Angela é uma jornalista prestigiada, com passagem por vários veículos de comunicação da região, entre eles a marca da imprensa buziana, o eterno e irreverente jornal “Peru Molhado”.

Coluna Clinton Davison

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