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Cidades

Casamento na Polícia, Honra e Reparação

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Por Professor Paulo Roberto

Professor Paulo Roberto dá aulas de história para o ensino médio em Cabo Frio
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Semana passada, escrevi aqui nesta coluna sobre os documentos da Casa de Detenção da Corte, que estão no Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro. Mas nesta instituição mesmo, outro conjunto de documentos permite também conhecer mais de perto o cotidiano e a história do povo do Rio de Janeiro. São os documentos do Instituto Médico Legal.

Caro leitor, se você não for amante de séries, peço que ao menos esta vez faça uma concessão, e assista ao menos um episódio de C(rime)S(cene)I(investigation). É um seriado sobre Ciência Forense, aquele ramo do conhecimento que permite que a Ciência auxilie as investigações criminais. É muito instrutivo, não apenas pelo fato do enredo ser bem construído, mas também porque permite entender o quão parecidas são a investigação científica e a criminal.

Pois bem, os documentos que estão no Arquivo Público do Rio de Janeiro foram produzidos pela instituição Instituto Médico Legal entre 1907 e 1960. A razão para esta delimitação de tempo reside no fato de que em 1907, o IML foi criado no pacote de uma ampla reforma da Polícia do Rio de Janeiro. E 1960 representa o ano em que com a mudança da capital federal para Brasília, o IML do Rio de Janeiro subordinou-se ao antigo Estado da Guanabara.

Naquela época, a criação de um instituto de investigação criminal significava um passo na modernização de uma instituição que não gozava nem um pouco da simpatia do povo do Rio de Janeiro. A Polícia do Rio de Janeiro, no início do século XX, era tida como corrupta, violenta e ineficiente, não raro, o Exército era convocado a intermediar disputas entre as forças da ordem e o povo carioca. Da mesma maneira, a simpatia popular pendia claramente para o Exército.

Os documentos do Instituto Médico Legal estão divididos em dois grandes grupos: os laudos cadavéricos ( os “exames no morto”) e os exames de corpo e delito (os exames no vivo”). Ali, é possível ter ao menos uma pálida ideia das vidas daquelas pessoas e de suas desventuras. Naqueles documentos é possível saber como se vivia e morria no Rio de Janeiro, até meados do século XX.

Aprende-se muito consultando aqueles documentos, Por exemplo, aprende-se que não existe morte sem história, mas isso não significa que toda morte tenha alguma explicação. Diferentes dos filmes das séries policiais nem sempre um crime encontra solução. Dentre tantas informações interessantes ali existentes, estão os exames de corpo de delito realizados em moças e mulheres, por conta de denúncias de defloramento, gravidez ou estupro. O que podemos inferir com estes documentos? Um pedaço da vida privada do Rio de Janeiro, principalmente das classe populares.

Pela leitura dos documentos é possível desenhar a cena na cabeça. A moça, constrangida e geralmente acompanhada da mãe, comparecia ao consultório do IML para se submeter a um exame médico. Ali, além de ter seu corpo vasculhado minuciosamente, ela respondia a um questionário com uma série de perguntas com o objetivo de saber se ocorrera algum crime previsto no Código Penal.

Pois bem, inúmeros dos laudos de corpo de delito realizados naquelas mulheres pobres, terminavam com a seguinte explicação dada pelo médico legista: o crime da perda da virgindade, ocorrera, em geral, por conta da “promessa de amor”. Ora, consultando o conjunto de documentos permite-se ter uma ideia aproximada dos eventos: o casal já se conhecia há algum tempo. O namoro em casa, rigidamente vigiado pelos pais, era uma etapa de um processo cujo final, seria o altar. No entanto, algo saíra diferente do esperado. A gravidez antes do casamento, os rumores dos vizinhos, a desonra dos pais e o segredo que saíra das quatro paredes de casa.

Ora, o exame no IML, em muitos casos, acabava servindo como a prova documental de que a “falta” cometida pelo rapaz, exigia uma reparação que só poderia ser o casamento. Não é difícil encontrar anexo a estes exames de corpo de delito, certidões de casamento. Sim, era o popular e conhecido “casar na Polícia”. Não encontrei registros sobre o que ocorreu “depois” do casamento, e se aqueles casais viveram felizes para sempre.

Por certo, não houve cerimônia, nem retrato e talvez nem mesmo festa nestes casamentos. Mas ficam algumas lições: em uma sociedade brutalmente masculina, como era o Rio de Janeiro daquela época, a Polícia, ao menos em alguns casos, era invocada para “reparar” algo que sem ela, dificilmente poderia ser remediado. Sim, a Polícia batia, matava e prendia, disso todo mundo sabia, mas também poderia intermediar e até casar as pessoas.

Talvez, maior lição dada por estes documentos é que a relação do povo do Rio de Janeiro com o Estado, em suas mais diversas materializações é bem mais complexa do que supões nossas teorias.

 

 

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