Menu

Cidades

Trincheiras e ruídos

Sarau Reviravolta

 

Dia 20 de novembro, fizemos o Sarau Revira-Volta, 6ª edição da proposta com o tema Resistência.
Escolhemos o tema por conta de ser consciência negra e tudo atrelado ao mesmo.
A foto é do João, morador de rua de Cabo Frio. João perambula pedindo as coisas, pedindo bebida e fazendo artesanato com folha de coqueiro pra sobreviver. Ele se sentiu atraído pelo Sarau, pelas palavras e quis se expressar. Ficou até o final e foi acolhido pelas pessoas que foram no Sarau.

Estava no boteko do Don Nicola, antes do Sarau Revira-Volta acontecer, na expectativa e ansiedades básicas pré-evento. Chega dois rapazes pretos, Moisés e Samuel, moradores de Monte Alto, periferia de Cabo Frio. Os dois são catadores de material reciclável e fazem isso todo o santo dia.

Era o dia da consciência negra e eles ali conversando, em um lugar de acolhimento, pois o Don Nicola de vez em quando os ajuda com almoço ou com um trocado. Fiquei olhando para os dois, revisitei meu léxico militante, minhas conceituações sobre racismo, preconceito e discriminação, o que poderia ser resistência e realmente percebi, de novo, o quanto de inoperância existe no discurso a partir daquilo que é objetivo e prático.

O nosso povo tá no precário, vive no precário e precisa do precário pra comer. Não há uma resolução de pequeno, médio ou grande prazo pra isso. O prazo seria romper com a estrutura, ou com as grandes estruturas. Como rompe?

Gostamos das grandes narrativas para explicar o que somos e como somos. E ainda corremos o risco de sermos interpretados de maneira equivocada, por pessoas de variadas matizes sociais, às vezes por ignorância, às vezes por dissimulação.

E em terra brasilis, a dissimulação é mãe do público. Por que digo isso? Pessoas como Moisés e Samuel podem ser usadas pra diversos exemplos. Exemplo de um projeto sobre negritude e como ele tá dando certo, exemplo de pessoas que mesmo na periferia, escolheram o caminho do trabalho em vez da criminalidade, exemplo do racismo estrutural, que não permite pessoas pretas irem muito longe, exemplo de que tem haver uma mudança radical na sociedade.

E além dos olhares condenatórios, das piadas mal intencionadas e dos xingamentos que esses garotos devem receber diariamente, cabe pensarmos nossa incapacidade de admitirmos o quanto estamos longe de qualquer solução plausível para que pessoas como Moisés e Samuel comam todos os dias, possam ir à escola sem impeditivos e possam ter acesso a bens culturais e materiais sem grandes esforços.

O discurso de lutar e conseguir pode convencer muita gente, mas pra uma parcela nem chega porque simplesmente não faz sentido. Ser discriminado por ser preto é algo tão corriqueiro e constante e o desespero real mesmo é de não conseguir sustentar os seus, seu grupo, sua família por mais um dia. E entenda por família, uma configuração complexa, além do que é passado na novela.

As pessoas são obrigadas a serem fortes, a serem resistentes, a serem resilientes. Obrigadas. Se não for, o trator passa e se for, o trator passa do mesmo jeito. O mundo se torna o lugar de opções discursivas, sem opções práticas além da sobrevivência e não existe nenhuma proposta plausível pra se romper com isso porque nem se pensa nisso direito.

Fábio Emecê
Professor de português do estado do Rio de Janeiro, rapper e ativista de causas ant-racistas

Já ouvi que deveríamos preparar os nossos para o Mundo de merda no qual vivemos desde crianças. Um mundo sem massagem, sem vontade que cheguemos a algum lugar, um mundo que não deixará de cuspir e nos dar rasteira sempre que puder. E que nossa dor diária e constante não pode ser palanque para se tentar participar desse mesmo mundo.

Realmente não sei o que fazer, só sinto que minha literatura anda gasta e o que o ruído nos assola. Vem na minha memória o Moisés e o Samuel dobrando a esquina, indo embora, pois estava ficando tarde para eles. Tá ficando tarde pra nós, tá ficando…

 

Nota da redação: escolhemos ilustrar o texto do  Fábio com imagens do último Sarau Reviravolta por considerarmos este uma das principais iniciativas culturais e de inclusão do ano de 2017 na Região dos Lagos.  

NOTÍCIAS DE GRAÇA NO SEU CELULAR

A Prensa está sempre se adaptando às novas ferramentas de distribuição do conteúdo produzido pela nossa equipe de reportagem. Você pode receber nossas matérias através da comunidade criada nos canais de mensagens eletrônicas Whatsaap e Telegram. Basta clicar nos links e participar, é rápido e você fica por dentro do que rola na Região dos Lagos do Rio de Janeiro.

Faça parte da nossa comunidade no Whatsapp e Telegram:

Se você quer participar do nosso grupo, a gente vai te contar como vai ser agorinha mesmo. Se liga:

  • As nossas matérias chegam pra você a cada 1h, de segunda a sábado. Informações urgentes podem ser enviadas a qualquer momento.
  • Somente os administradores podem mandar os informes e realizar alterações no grupo. Além disso, estamos sempre monitorando quem são os participantes.
  • Caso tenha alguma dificuldade para acessar o link das matérias, basta adicionar o número (22) 99954-6926 na sua lista de contatos.

Nos ajude a crescer, siga nossas redes Sociais: Facebook, Instagram, Twitter e Tik Tok e Youtube

Veja Também

Saiba onde e como fazer doações para ajudar o Rio Grande do Sul

Prefeito de Búzios garante continuidade do diálogo institucional com presidente da Câmara e vice-prefeito

Guarda Ambiental de Búzios e Instituto Larissa Saruê realizam soltura de animais silvestres na APA do Pau Brasil

Cabo Frio amplia vacinação contra a gripe influenza para toda a população acima de 6 meses